26 de fev. de 2017

Conceito: Apropriação cultural

Este é um tema que o movimento negro esteve abordando com intensidade nessa década. Já houve muita controvérsia e divisão entre quem concorde, discorde, ou não saiba o que pensar.

O que pode ter contribuído para que o assunto fosse muito rejeitado pela população geral é o modo como ativistas e militantes do movimento trataram o assunto.

Primeiro de tudo: apropriação cultural realmente existe? A resposta é: sim! Deixe-me explicar.

A apropriação abordada não é apenas uma cultura pegar o elemento de outra cultura. É uma questão mais complexa. Vivemos num mundo globalizado, consequentemente as culturas estão misturadas com outras. Sem contar os países colonizados por outros, como o Brasil.

Vamos analisar a seguinte questão:

Uma cultura dominante - social e historicamente privilegiada - pega elementos de uma cultura oprimida, coloca esses elementos em sua população, descarta o significado cultural desses elementos, e ainda recebe lucros ao vendê-los como moda, produto de beleza.

Essa é a verdadeira apropriação cultural que o movimento negro tanto aponta. A cultura branca pega elementos afroculturais, enfatiza que estes elementos só são admiráveis nas pessoas brancas, e as instituições (brancas) crescem economicamente com isso. Além de que aqui no Brasil temos o racismo estrutural, o preconceito em nosso sistema - que marginaliza e oprime a população negra.

Não acha um absurdo pessoas brancas aparecendo em revista de moda com turbante enquanto descendentes da cultura de onde veio o turbante são excluídos, discriminados, agredidos e mortos? 

Por isso é importante falar sobre apropriação cultural! Ela existe! Mas está sendo mal-interpretada por todos os lados. Não devemos individualizar a questão, tentar combatê-la fazendo pessoas brancas pararem de usar elementos afroculturais. Os verdadeiros inimigos são as instituições. A luta é contra o sistema racista e apropriador.



23 de fev. de 2017

Geração mimimi

"Ai, essa geração mimimi é foda, né. Hoje em dia não se pode fazer piada, não pode falar isso ou fazer aquilo, tudo é preconceito, tudo é opressão, agora eu sou opressor, tá foda viver atualmente."

Quem nunca leu ou ouviu isso por aí?

Caramba, como os tempos atuais são um mar de sofrimento para essas pessoas, né? Fico com tanta dó, quase escorre uma lágrima aqui.

Coitadas dessas pessoas, que dó, que dó. Não pode mais fazer piada com o gay, não pode zoar o cabelo do negro, os manos não podem nem chegar pegando na cintura das minas. Ai, essas minorias malvadas que querem privilégios e problematizam tudo. A gente tem até medo de se expressar livremente na Internet, vai que nos processam.

Ok, falando sério agora. Já pararam para observar quem mais reclama do mimimi? O público que prevalece são homens heterossexuais e cisgêneros, brancos, de classe média ou alta. A maioria é religioso, normalmente cristãos. Curioso, não?

Mas por que o mimimi "oprime" tanto essas pessoas?

Classes majoritárias sempre tiveram seus direitos garantidos, sempre foram aceitas pela sociedade, nunca sofreram qualquer tipo de discriminação por suas características, e sempre tiveram liberdade de ser e viverem como querem.

Classes minoritárias ainda precisam lutar por direitos básicos, ainda sofrem repreensão social apenas por serem o que são, existe todo tipo de discriminação e cometida diariamente contra elas, e não têm a mesma liberdade que a maioria. Só não enxerga quem não quer.

Preconceito em todo lugar? Sim, está todo lugar, do nível mais agressivo até o mais sutil. Nos acostumamos tanto a reproduzir vários preconceitos que é difícil admitirmos. Que tal começar a enxergar as coisas de outro jeito ao invés de chamar tudo de mimimi. Que tal ouvir ao invés de chamar tudo de mimimi? Que tal questionar um pouquinho sua vida, a sociedade e o sistema antes de falar "ai, isso é mimimi"?

Seria mais prestativo para si e para o mundo do que ficar chorando porque não pode fazer piada com uma minoria, fazer escândalos porque te repreenderam por algo que disse ou fez, escrever textão contra o "politicamente correto", e ainda inventar opressões (heterofobia, misandria, racismo reverso etc). E depois as minorias é que ficam de mimimi, né?

A geração mimimi existe. E não são as minorias sociais e nem quem as apoiam.

Paz!



18 de fev. de 2017

Quem está fora da sigla LGBT?

Quem pesquisou a respeito do movimento e sobre toda diversidade existente deve ter se perguntado: por que a sigla é só "LGBT"? Afinal não existem só gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros.

Quando nos referimos a pessoas LGBTs, não falamos apenas das classes da sigla, e sim de toda diversidade de sexualidade, gênero, sexo e afetividade que existe fora do padrão conhecido heterossexual-cisgênero-diádico-monogâmico.

As classes presentes na sigla são aquelas com movimentos político-sociais organizados e reconhecidos em escala mundial (apesar de muita gente nem conhecer a sigla ou o movimento). Faz pouco tempo que queers começaram a ser incluídxs por muitos grupos. Outras classes que estiveram recebendo atenção são intersexuais e assexuais.

Assexuais, assim como pansexuais, estão no processo de conquistar seus espaços, tanto dentro quanto fora do próprio movimento. Assexualidade esteve sendo mais abordada bem recentemente, enquanto pansexualidade é mais debochada do que ignorada. As demais identidades sexuais - grissexual, polissexual, escoliossexual - ainda não se manifestam no sentido político.

Se tratando de gênero, pessoas de gêneros não binários também estão lutando por visibilidade. Infelizmente, a transfobia ainda é muito presente pelas pessoas cisgênero em geral. O que ainda dá alguma esperança é que gênero é um dos maiores assuntos desse século.

Pessoas intersexuais conseguiram alguma atenção do público geral, embora ainda haja tanto ignorância quanto preconceito com elas. A comunidade LGBT lhes oferece uma segurança relativa, porém suas maiores pautas precisam ser debatidas, como a luta contra a patologização da medicina sobre seus corpos.

E, por fim, o movimento também acolhe as pessoas poliamorosas. Falar de poliamor não é novidade, mas é um tema muito apagado na sociedade devido ao sistema monogâmico da grande maioria dos países.

Internacionalmente, a sigla LGBT permanece como a oficial e a mais reconhecida. Há coletivos de outros países (ex: EUA) que fazem uso da sigla LGBTQ (incluindo queers), LGBTI (incluindo intersexuais) ou até LGBTQIA (incluindo assexuais). Está ficando popular o termo LGBT+ para se referir a todas as classes sem alongar a sigla.

Existem propostas que constroem siglas muito grandes, algumas incluindo H de hétero (no caso de transexuais) e até A de aliança (o que, particularmente, não acho necessário).

Não sei como ficará a sigla no futuro. Seria ótimo incluir todas as classes, porém, uma sigla gigante ficaria confusa. Talvez (opinião minha) o melhor fosse unir todas as classes como apenas "diversidade". 

Independentemente do que o movimento será chamado, torço para que as demais classes conquistem seus direitos e tenham reconhecimento mundial.



15 de fev. de 2017

Minha opinião sobre Thauane Cordeiro

Em toda polêmica envolvendo pessoas negras e pessoas brancas procuro ficar sempre do lado da classe oprimida - no caso, a classe negra. No caso de hoje, meu posicionamento será diferente.

Uma moça caucasiana chamada Thauane Cordeiro relatou ter sido abordada dentro de um metrô por uma moça negra, que a repreendeu por estar usando turbante. Thauane reagiu ignorando-a e saindo do vagão. Em seu texto no Facebook, ela finalizou o relato com #VaiTerTodosDeTurbanteSim e foi infeliz ao se dizer uma "branca negra".

Há quem duvidou de sua história. Não vou entrar nesse mérito. Eu acho possível algo assim ocorrer, então vou dissertar sobre o caso como se fosse verdade.

Eu compreendo a ideia que o movimento negro quer passar quando fala sobre apropriação cultural. Sim, existe uma apropriação da cultura negra em nossa sociedade. As instituições pegam elementos da cultura negra (sem sequer apontar seu valor cultural) e os transformam em enfeites - e aceitáveis quando usados por pessoas brancas. Lucram com isso, e o povo negro continua sendo marginalizado graças ao racismo estrutural. 

O verdadeiro problema não está numa pessoa branca usar um turbante. E sim como o turbante é representado por essas mesmas instituições. A questão não é individualizada e sim institucional. Empresas capitalistas comandadas por uma etnia privilegiada ganham à custa de uma etnia oprimida. Acho que dá para entender a extensão desse assunto até aqui.

Agora, vamos ser racionais e analisar a situação: impedir que as pessoas usem uma peça de roupa é impossível. E mesmo que fosse possível, pessoas brancas não usarem roupas da cultura negra não vai reduzir o racismo ou reformar o sistema. Mais uma coisa: essa repreensão contradiz a máxima "meu corpo, minhas regras", que é válida para todo mundo.

Sim, gostem ou não, todas as pessoas têm a liberdade de usarem o que quiserem, seja de sua cultura ou não. E isso é comum nesses tempos de globalização. E vale lembrar que turbante não é exclusivo de culturas africanas.

Falar da apropriação cultural é importante para a luta do movimento negro. Mas individualizar o problema não resolverá nada e mostra um radicalismo que pode afastar a população geral do movimento.



12 de fev. de 2017

Vamos expor!

Recentemente teve um caso que repercutiu nas redes sociais de um estagiário de uma empresa que fez postagens anti-feministas. Ele publicou duas fotos e nas legendas falou as merdas machistas típicas.

Essas fotos vazaram e em pouco tempo a empresa o demitiu, fazendo uma nota de esclarecimento.

Muita gente aplaudiu o ocorrido (eu, inclusive) e a história parecia ter tido um final feliz, quase uma fábula com uma lição de moral no final. Até eu considerei aquilo uma justiça. O problema é o que veio depois desse "final feliz".

O rapaz está numa nova empresa (que também já gerou polêmicas com feministas) e ganhou fama nas redes sociais por parte de seguidores de ideologias conservadora e fascista. Ops, o tiro saiu pela culatra...

Como explicar esse efeito?

Pode parecer uma excelente estratégia - e justiça - expor pessoas escrotas que estão estagiando ou trabalhando e causar sua demissão. Mas esse caso (e alguns outros) comprovou que isso não funciona como esperamos.

A Internet é vasta e nela há todo tipo de pessoa. As fotos chegaram tanto nos grupos de movimentos sociais quanto nas famosas oposições. E elas fizeram o que militantes e ativistas estão deixando de fazer: uniram-se.

Expusemos uma pessoa espalhando ódio na esperança de que o ódio fosse combatido. Ao invés disso demos voz ao ódio. Permitimos que outras pessoas se unissem ao rapaz para propagarem mais discriminação. Sim, fizemos propaganda para ele. A mesma propaganda que fazemos de outras figuras de ódio, como um certo deputado cujo nome nem pronunciarei.

E convenhamos, se fosse para cada pessoa preconceituosa perder o emprego, então milhares de pessoas deveriam estar na rua agora. Isso é realmente uma boa estratégia? Direito ao trabalho é um direito básico das pessoas. Pensem nisso.

Sim, está na hora de uma mudança na estratégia. Precisamos dar mais visibilidade a todxs que produzem conteúdo progressista e inclusivo, que problematizem e ensinem a desconstrução, que atuem de verdade nas militâncias e ativismos.

Se tiver as opções de compartilhar as palavras de uma pessoa preconceituosa ou um texto que fale sobre preconceito, compartilhem o texto. Mostrem esse tipo de conteúdo. Espalhem. Alguém com certeza lerá e poderá abrir a mente, melhorar.

Militantes e ativistas precisam de visibilidade! E não ódio!

Esse caso me fez perceber que ignorar gente retrógrada é o melhor caminho; deixem elas vomitar ódio para o nada e lutem por um mundo com menos ódio.



8 de fev. de 2017

Mais personagens LGBTs em games

Personagens LGBTs em jogos já foram assunto aqui no blog. Falei de gays, lésbicas, bissexuais e de transexuais e travestis em games. Mas como devem saber (ou não), essas não são as únicas classes que compõem toda diversidade presente na população LGBT.

Aqui falarei sobre personagens das classes que não estão presentes na sigla oficial:




  • Dragon Age: Inquisition

O mercenário Iron Bull é definido como pansexual, segundo a produção do jogo. Ele é um possível parceiro afetivo no jogo e é conhecido por ter se relacionado tantos com mulheres quanto com homens. Ele perdeu um olho enquanto defendia Krem, um homem trans, que hoje é um de seus tenentes.

(Iron Bull)

  • NieR

Kainé é uma mulher intersexo e uma das três pessoas que protagonizam a franquia. Sua condição genital fez com que ela sofresse chacota e solidão na infância. Somente sua avó a acolheu. Ela se veste de sua maneira habitual para se sentir mais feminina.

(Kainé)


  • Persona 2


Sumaru Genie é uma vidente intersexo e coadjuvante do jogo, que utiliza magias de diversos efeitos por um tempo limitado.

(Sumaru Genie)

  • Borderlands 2

Um dos escritores do enredo do jogo confirmou que a personagem Maya foi criada para ser assexual.

(Maya)


  • Undertale

Frisk é a criança que protagoniza o jogo. Seu gênero nunca é revelado ou determinado. O jogo e os personagens se referem à criança com pronomes de gênero inespecífico (they). Apesar de não ter sido confirmado oficialmente, isso pode indicar que Frisk é uma pessoa de gênero não binário.

(Frisk)


  • Gloria Union

Kyra está entre os antagonistas do jogo e é uma pessoa de gênero não binário. Sua aparência é feminina, mas seu diálogo utiliza pronomes masculinos. O jogo trata Kyra como uma pessoa intergênero (entre os gêneros masculino e feminino).

(Kyra)



Outras sexualidades além de homo e bi, intersexos e pessoas não binárias são ainda raridades nos jogos de videogame. Espero que a visibilidade desses grupos aumente junto com as mais conhecidas. Toda forma de representatividade é necessária!



4 de fev. de 2017

Linguagem neutra

A língua portuguesa quase não vive sem gênero. Ao contrário de outras línguas, como o inglês, a nossa dificilmente não faz distinção de gêneros ou não os utiliza nos vocábulos e frases. Daí vem aquela perguntinha: como ficam as pessoas não binárias no idioma?

Na Internet colocamos x ou e nas palavras com gêneros, até modificamos outras em que mudar a última letra não é suficiente. Porém, essa tática tem suas desvantagens e a grande maioria das pessoas não entenderia isso. E, se for publicar um livro, editoras não aceitariam "todxs" ou "amigues".

Como incluir pessoas não binárias na sua comunicação, seja verbal ou escrita? Vou falar sobre alguns métodos para tornar sua fala/escrita mais neutra.

1- A palavra de ouro para neutralidade é 'pessoa'. Não quer falar o gênero? Fala pessoa. Não sabe o gênero? Fala pessoa. Não quer usar o masculino para se referir a uma multidão ou ainda separá-la em homens e mulheres? Fala pessoas. Outras palavras neutras são indivíduo(s) e pessoal.

2- Uma forma de deixar um texto mais neutro é evitar adjetivos com gênero. Se eles são derivados de verbos, use-os. Saiba utilizar também substantivos e advérbios. E, quando necessário, corte palavras, escreva diferente. Pense em alternativas.

- João estava evidentemente exausto. Sentado na cadeira, ficou lá por horas.
- A exaustão era evidente em João. Sentou-se na cadeira e assim ficou por horas.

- Maria caminhou eufórica. Naquele dia estava mais bela que no dia anterior.
- Maria caminhou euforicamente. Naquele dia sua beleza estava maior que no dia anterior.

- Alex estava muito preocupada com a questão ambiental.
- Alex mostrava muita preocupação com a questão ambiental.

- Kim estava perdido, sem saber o que fazer.
- Kim não sabia o que fazer.

3- Felizmente pode-se utilizar diversos adjetivos "sem gênero", tais como: forte, inteligente, carente, inocente, profissional, amável, inútil, e assim por diante. Há uma variedade desses adjetivos, basta procurar.

4- Evitar uso de artigos (o/a) e fazer uso de preposições e pronomes neutros, como "de" e "lhe". Exemplos: Ariel tem dois cachorros / Fomos na casa de Marcos / Você podia ter lhe contado isso.

5- Profissões que tenham distinção de gênero acabam tendo que ser alongadas:

- Taylor era formada como professora de geografia.
- Taylor tinha formação em licenciatura em geografia.

Ou a frase pode ser escrita de outro modo:

- Ligaram para Lian, que era mecânico, para concertar a pia.
- Ligaram para Lian, que trabalhava com mecânica.

Usar uma linguagem neutra requer técnica e conhecimento em alternativas de expressão das frases. Por causa de nossa língua, a neutralidade tem seus limites. O texto pode ficar mais extenso do que seria. É um desafio.

Esse é meu "tutorial" sobre neutralidade na língua portuguesa. Espero que tenham gostado e aprendido, pessoas.



1 de fev. de 2017

Pensamento do dia

Pra que tantos carros?

Vejo carros, veículos, pra todo lugar que olho ou ando. São muitos, demais! Parece que tem mais automóveis do que gente no planeta.

Mesmo em cidade pequena vejo muitos deles. A todo momento, não importa a hora, eles estão na rua, com seus pneus girando, seus motores queimando, e seus barulhos.

Pra que tantos carros?

As pessoas necessitam tanto assim deles? Necessitam toda hora? Ninguém pode abrir mão deles por um dia, e sair para andar, andar com as próprias pernas?

E pensar que eles todos emitem poluição em nossa atmosfera. Agora pensem na quantidade de carros por aí. Considerem que tem gente que tem dois carros.

Pra que tantos carros?

Ainda me pergunto se é realmente necessário as pessoas estarem usando carros todo dia a todo momento. 

Cadê as pessoas? Só vejo carros...