28 de fev. de 2018

Linguagens elitizadas?

O que estive mais vendo e ouvindo recentemente são discussões a respeito do quanto o acesso à informação está limitado para populações mais periféricas, e das linguagens elitizadas usadas por pessoas com acesso a essas informações e os espaços com essas informações.

As discussões são válidas até certo ponto, quando não tomam o rumo que vejo frequentemente tomarem. Quando certas pessoas apontam elitismo, elas se referem ao monte de termos e definições  criado até agora para explicar sobre toda diversidade da comunidade LGBTQIAP+. É aí que essas pessoas prestam um imenso desserviço.

Pra começar, sim, eu estou ciente de que populações periféricas não têm o mesmo acesso ao conhecimento que gente das outras classes socioeconômicas. E mesmo gente de classe média-alta pode ser ignorante, pois ter acesso não significa ter interesse no conhecimento.

Ninguém está propondo chegar nas periferias com palavras difíceis e explicando dezenas de conceitos de uma vez, e esperar que todes entendam rápido e se desconstruam em um minuto. Isso não acontece com nenhuma pessoa. É um processo. E não respeitar esse processo e ainda não ter a didática necessária para se comunicar com as pessoas seria sim muito elitismo.

Agora, pessoas com esse discurso aparentemente solidário o fazem se referindo a identidades, terminologias inclusivas e conceitos explicados da maneira mais correta possível.

Falar sobre orientações multi ou do espectro A "é muito elitista". Usar termos que não discriminem certos grupos "é muito elitista". Explicar sobre orientações, gêneros e sexos biológicos de maneira atualizada "é muito elitista".

Sabe o que é muito elitista? Presumir que a periferia é incapaz de absorver novas informações e de entender certos conceitos da maneira como devem ser entendidos. Pessoas são capazes de aprender. Basta ter paciência e didática e se esforçar.

Sem contar que esse "montão" de identidades está tão grande e continua aumentando porque existe uma infinidade de experiências e vivências. E com certeza há pessoas da periferia que podem se encontrar em identidades até recentes. Esconder essas identidades delas é necessário porque a pessoa "pode não entender a definição"? Acham mesmo que a própria pessoa não entenderá algo que a descreve?

Você pode até julgar necessário usar uma linguagem ultrapassada e até discriminatória para se comunicar com determinadas pessoas. Mas em algum momento você é sim obrigade a apresentar uma linguagem mais precisa. Como fazer isso? Bom, isso cabe somente a você. Assumir a missão de ensinar precisa de planejamento e preparação, tenha isso em mente.

A periferia tem capacidade de aprender. Afinal ela também desenvolve terminologias e conceitos própries - mesmo que algumes possam ser discriminatóries ou equivocades. E as subculturas periféricas têm identidades válidas e até políticas. Mas trazer um conhecimento que não perpetua opressões é mais do que necessário para que as pessoas se entendam e entendam as outras, e isso vai construindo uma rede progressiva de tolerância e respeito, e até fortalece a participação política das periferias.

Não é difícil explicar que tal palavra está errada por tal motivo, não é difícil dizer que existe tal conceito para definir tal coisa, não é difícil falar uma palavra nova e sua utilidade. Repito, é um processo. Ter paciência e didática são fundamentais.

Já que falam tanto em linguagens elitizadas e acesso limitado à informação, que tal começarem a discutir em como tornar um conhecimento livre de opressões acessível e compreensível? Não é melhor? Porque se acham melhor continuar usando linguagem discriminatória e equivocada, parabéns, vocês provam que não se importam de verdade com toda diversidade. E nem com a periferia. Quem se preocupa, educa.

E não, não precisa encher a cabeça das pessoas com incontáveis palavrinhas novas. Listas e glossários existem justamente para organizar termos e definições num lugar só. As pessoas podem esquecer coisas. E não são realmente obrigadas a memorizar tudo que existe.

Vale lembrar também que as pessoas no fim escolhem aprender ou não. Quem não faz esforço para entender ou não mostra nenhum interesse não deve ser considerade como ignorante. Fazemos nossa parte: passar conhecimento. Se a pessoa não o aceita, daí é problema dela.

Se você chama uma linguagem inclusiva e correta de elitizada, você é muito desoneste, tem preguiça de ensinar, está sendo excludente com muita gente, e pensa de forma elitista.