AC: discursos em geral de apagamento e silenciamento contra microcomunidades.
Isso não é novidade e faz tempo que vejo esse discurso. Mas senti vontade de comentar sobre isso porque recentemente o vi sendo repetido várias vezes por aí nas redes sociais.
Enquanto temos movimentos sociais se apoiando em identidades, há pessoas que se declaram como "sem rótulos". Entre elas temos aquelas que apenas dizem rejeitar rótulos pra si, e aquelas que pregam que ninguém deveria se rotular.
Muito bem. Claro que defendo a liberdade do indivíduo de não se rotular. Se uma pessoa não quer adotar identidades pra si, direito dela. O problema mesmo é com o discurso impositor e no que ele implica.
Não acho coincidência que tantas pessoas que se posicionam contra "os rótulos" sejam despolitizadas, ou apenas alienadas, ou gente intolerante com a pluralidade de identidades (possivelmente com opressão internalizada). Percebo que muitas dessas perspectivas são muito rasas, e não enxergam que identidades descrevem experiências e mobilizam pessoas em busca de demandas. Há pessoas assim muito marginalizadas. Mas não acho coincidência haver tantas privilegiadas o suficiente para não se importarem tanto com possíveis opressões que possam atingi-las.
No mundo atual onde existe tanta discriminação, desigualdade social, e opressões estruturais, "rotular-se" (algo que soa negativo, mas nem deveria sê-lo) é uma necessidade. Por isso existem movimentos sociais.
Agora, outra coisa que acontece muito são pessoas de determinadas identidades fazendo esse discurso em situações convenientes. Podem reparar que dificilmente haverá uma pessoa gay ou lésbica ou trans binária dizendo que "não precisa desses rótulos". E, da mesma forma, é fácil ver pessoas desses grupos e ocasionalmente de outros (bi, assexuais, não-bináries) fazendo esse discurso quando o assunto são identidades mais específicas.
Devo ressaltar que pessoas bi ainda são muito invisibilizadas. E pessoas (que se dizem apenas) assexuais e não-binárias ainda estão lutando por alguma visibilidade. Mas até mesmo esses grupos fazem coro contra identidades multi, a-espectrais e n-b. Já falei sobre reducionismo identitário aqui no blogue.
Então vamos a tudo que me incomoda muito nesse discurso de sem rótulos: o quanto ele é usado para silenciar pessoas, diminuir ou anular experiências, ignorar realidades e fenômenos que envolvem opressões, e fazer hierarquias entre quais identidades são "realmente políticas" e quais demandas são "mais relevantes".
E, afinal, de onde vem essa rejeição ao rótulo? Isso é justificável? É ignorância política? É apenas preconceito com experiências mais incomuns? São coisas a se pensar.
Se você quer seguir sem rótulos e isso funciona pra você, muito bem. Isso só é um problema quando parte de fatores problemáticos e quando vira uma arma contra gente com vivências e demandas ignoradas ou desmerecidas.