9 de jun. de 2018

O sexo biológico

Há pouco tempo perambulou por aí pela Internet essa imagem:


E eu propus a seguinte resposta: E) Masculino, masculina, provavelmente homossexual.

Provavelmente homossexual porque, bem, não foi constatada uma atração exclusiva por homens. N pode ser bi, pan, poli, oni, assexual homorromântico, entre muitas outras possibilidades.

Agora, sobre o sexo. Primeiramente, se N já estava com sua documentação retificada, por lei, seu sexo é masculino. Mas sei que a questão foi formulada pensando na corporalidade de nascença, e muita gente também nem se importa com o que tem respaldo por lei.

Não apenas gêneros começaram a ser questionados como também os sexos. Como foram classificados? Por que são classificados? Para que são classificados? Vamos discutir então!

Primeiro de tudo, a classificação dos sexos em masculino e feminino já é uma exclusão aos intersexos por definição. Ainda assim corpos intersexos são logo mutilados justamente para serem encaixados em uma dessas definições. E para se encaixarem no que a sociedade considera como um sexo aceitável, para também serem encaixados na visão social de homem e mulher.

Pois bem, antes falam que a biologia define gênero, mas sexos "adversos" devem ser "corrigidos" para então a pessoa "ser homem/mulher"? Percebe-se aqui então que: nem a biologia sexual é binária e misturam-se noções sociais (subjetivo, afinal são mutáveis) com anatomia (objetivo, pois é material). Então... nada é muito absoluto como tanto afirmam, né?

Sem contar que as noções do ser homem e do ser mulher mudam de cultura em cultura, de época em época. Nem isso é absoluto, até isso é subjetivo. Mas vamos focar no sexo.

Sexo é composto por cromossomos, hormônios, gônadas e genitália. Os sexos definidos como masculino e feminino são bem construídos, com padrões a serem atendidos. Nos ensinam que o masculino é XY, testosterona, testículos e pênis; e o feminino é XX, progesterona e estrogênio, ovários e vulva.

Pois bem, nem vou falar das pessoas intersexo e da diversidade imensa na intersexualidade, vou falar da diversidade dentro dos sexos "binários": existem muitas variações hormonais entre as pessoas. Pode haver atividade baixa ou alta dos hormônios predominantes, ou pode haver atividade dos outros hormônios (pois todos estão presentes em todos os corpos).

E tais atividades produzem variações nas anatomias, que podem entrar ou não em discordância com outras noções sociais do que são corpos "masculinos" ou "femininos" (tamanho do pênis é associado com virilidade, tamanho dos seios com feminilidade, etc).

Agora, a mera classificação de masculino e feminino. O que exatamente é masculino e feminino? O que torna um pênis masculino? O que torna uma vulva feminina? O que determinou que o cromossomo Y é masculino? O que determinou que o cromossomo X é feminino (isso quando não acompanhado do Y, porque... sei lá)?

Desafio alguém a dissertar sobre tudo isso sem cair em achismos, estereótipos de gênero, explicações vagas, termos abstratos ou ideias mutáveis sobre masculinidade e feminilidade.

Até agora a única função que percebi dessas classificações sexuais é apenas para impor os gêneros binários às pessoas, junto com papéis e comportamentos de gênero (que podem ser opressivos até mesmo para as pessoas cis). Se gênero é questionável, por que sexo não o seria também? Sexo não é binário e classificá-lo não tem base científica.

Por isso prefiro seguir os pensamentos da Teoria Queer e aceitar que o sexo esteja sempre de acordo com o gênero. Portanto nosso amigo N, um homem trans, tem sexo masculino, porque seu gênero é masculino. Ele é homem; sua vulva, seus ovários e seu útero são de homem.

"Ah, se agora as pessoas podem dizer o que quiser do seu sexo, como fica as questões de saúde?"

Ora, a comunidade médica que crie um novo sistema de identificação sexual!

Uma alternativa que imaginei seria utilizar códigos que definissem que tipo de genitália, gônadas, hormônios e cromossomos a pessoa tem. Basta identificar o tipo sexual da pessoa ao nascer, registrar seu código, e pronto, problema resolvido. E a pessoa pode nomear seu sexo como quiser, dentro de sua subjetividade enquanto ser humano (que não interessa ao sistema de saúde).

Isso resolveria também muitos problemas de pessoas transicionando biologicamente e de pessoas intersexo. Ideias existem, só não há força de vontade. Classificações sexuais apenas servem para sustentar o cissexismo e o diadismo.

É bizarra essa necessidade de mencionar sexo "masculino"/"feminino" quando se trata de pessoas trans. Isso definitivamente não é respeitar a identidade da pessoa, parece sempre uma forma de dizer que "no fim ela é o que nasceu".

Corporalidade é um assunto íntimo. E nem está inclusa nas definições de atrações ou de identidade de gênero. Saúde? Ora, quem tem próstata vai em proctologista, quem tem vagina vai em ginecologista, e etc. Simples. Só precisam saber o órgão, não classificação do sexo.

Finalmente estamos percebendo o que sexo realmente é: apenas sexo.