Aviso de conteúdo: religião, política.
Pra quem não vive dentro de uma caverna, acho que não preciso comentar sobre os acontecimentos recentes e horríveis. Não vou falar sobre aborto. Até porque é possível encontrar conteúdos relevantes sobre o assunto numa pesquisa feita na boa vontade. Vou falar de religião, um daqueles tópicos que muita gente acha que não deve ser discutido, mas deve sim.
Longe de mim fazer discurso anti-religião, ou mesmo anti-cristão. Sei que nem toda religião é opressiva, e sei que existem ótimas pessoas seguindo vertentes cristãs. Esse artigo não é para essas pessoas, e muito menos uma crítica individual. O que quero apontar é uma questão estrutural.
Embora nosso Estado seja laico (em teoria, muito em teoria), podemos presenciar influências cristãs para todo lado, chegando no Congresso, no judiciário, e em discussões sociais.
Quando vemos gente cristã fazendo merda, mostrando o que tem de pior, incrivelmente aparece uma legião com a famosa defesa "mas nem tode", demandando que não haja "generalizações", e se defendendo como se fosse o real alvo da crítica.
Também já vi umas vezes gente cristã com a tal "culpa" de ser de um grupo opressor, igual a gente branca com culpa branca, ou gente hétero com culpa hétero, ou gente cis com culpa cis, e por aí vai. Gente que levanta da cadeira e diz com olhos marejados que não é perigosa, que está "do nosso lado", e até pedindo perdão pelos erros de "seu grupo". Comovente igual a um drama mexicano.
Eu ainda tenho mais empatia por esse grupo. Agora, já faz muito tempo que me irrito muito com gente querendo desculpabilizar a religião quando a religião é a culpada e a cúmplice.
Não adianta chamar de minoria esse número assombroso de gente que promove ataques virtuais, boiotes, mobilizações nocivas, quando é a religião dessa gente que impulsiona essas coisas, e quando é essa religião que está impregnada nas estruturas de poder.
Não adianta querer defender que todas essas pessoas não são "verdadeiras cristãs" quando elas fazem barulho e promovem todo estrago que fazem tudo em nome de seu deus e sua fé.
Mais útil do que essa tentativa fútil de desculpabilizar a religião como um instrumento efetivo de opressão atual (e histórica, já que tivemos a Idade das Trevas, lembram?), seria fazer uma autocrítica e se movimentar junto com outres cristanes para mudar essas estruturas de poder. Ficar se esquivando só as reforça, querendo ou não.
Melhor do que tirar essa culpa seria tirar aquelus que estão no poder usando da religião para oprimir, e tirar as influências religiosas de todas as decisões do Estado sobre todo o povo brasileiro. Melhor que isso seria ajudar a construir um Estado verdadeiramente laico, e reformular o modo como figuras e grupos religioses tratam questões sociais num geral.
Sinto muito que tenha tanta gente ruim dando uma péssima imagem à religião, mas também não ajuda em nada ignorar o poder de uma crença usada com fundamentos opressivos. A história está aí pra provar isso. Existe algo muito maior aqui que sentimentos feridos. Talvez esteja na hora de repensar sobre isso e enxergar o problema como estrutural. Passou da hora de aceitar que política e religião se discutem, ainda mais quando estão misturadas.