A censura é uma barreira para o conteúdo considerado ofensivo para um Estado. Embora os jogos listados aqui sejam de épocas diferentes (não muito distantes, mas diferentes), nota-se, além dos preconceitos típicos da "era moderna", certa hipocrisia. Será que algumas censuras não
foram injustas e sem lógica quando analisamos os jogos em
questão, mesmo para suas respectivas épocas?
Só para
esclarecer, não vou discutir sobre games banidos. Posso falar disso em outro
post futuro.
Vou
começar por uma série de survival horror que gostei muito no passado: Resident
Evil.
No
primeiro jogo lançado da franquia, a cena (fodasticamente terrível) do primeiro zumbi
gerou polêmica. Na versão original, o zumbi comia (literalmente!) um cara e,
antes de ele mostrar sua face, a cabeça da vítima caía no chão e revelava
metade do rosto comido. Esse detalhe da cabeça foi censurado em outras versões.
O pessoal achava violento demais...
E vem cá:
onde Resident Evil não é violento? Você mata zumbis canibais, explode a cabeça
deles, mata criaturas e monstros (incluindo cachorros, tubarões, plantas
gigantes etc), vê cenas horríveis de morte, o jogo apresenta sustos e ambientes
de tensão, você fica pasmo com a brutalidade da cena do Tyrant atravessando as
garras no Wesker... Mas não, não podemos ver uma cabeça meio comida.
Traumatizante demais, né?
Outras
censuras foram relacionadas ao sangue e a violência das cenas de morte dos
personagens, tanto em RE 1 quanto em RE 2. Cai exatamente nessa mesma linha de
raciocínio.
Outro
caso (ainda mais hipócrita) foi a censura de duas cenas: uma apresentava os personagens
de RE 1 usando atores reais e outra era o Bad Ending do Chris. Nessas cenas,
originalmente, o ator do Chris acendia um cigarro (fazendo aquela pose sexy de
bad boy *---*). As demais versões cortaram
essa parte.
Vamos
entender a lógica: num jogo de terror com zumbis, matança, morte, sangue,
tiroteio, monstros e etc, um cara fumando um cigarro é mais ofensivo. Tá serto!
No
clássico The Legend of Zelda: Ocarina of Time, originalmente Ganon cuspia
sangue quando derrotado na primeira batalha; isso no Nintendo 64 NTSC-U/J versão
1.0 e 1.1. Nas versões seguintes, NTSC-U/J 1.2 e PAL, e no GameCube, a cor
vermelha foi substituída por verde. E pronto! Disfarçaram a violência! ¬¬
Claro, né! A história conta sobre um menino, que nem chegou na
puberdade, sendo colocado numa missão árdua de salvar o mundo, que mata
inimigos diversos com uma espadinha, alguns inimigos (aranhas, Stalfos) se
despedaçam quando morrem, com até uma princesa-peixe que exige casamento dele (Princesa
Ruto), com aparição de zumbis e cenários tenebrosos (cemitério, poço, Templo da
Sombra; principalmente esse templo!). Mas não, ofensivo é mostrar um pouco de
sangue no final, na luta contra o chefão...
Ainda na mesma franquia, Majora's Mask, um dos capítulos mais
"tenebrosos" da série, teve uma censura que supostamente relacionada
a racismo. O personagem Skull Kid, na versão original do Japão, tem a cor da
cabeça mais escura. Nas demais versões (essa eu tenho), sua cor é mais clara.
Há indícios de que isso tenha sido feito para evitar acusações de racismo. Eu, particularmente, não acharia racista manterem a cor mais escura do Skull Kid. Nem consigo enxergar algum racismo nisso. Porém, não é por que eu não vejo racismo que ele não possa existir. Vale lembrar que eu, por ser branco, posso não ter uma visão ampla. O mais apropriado seria perguntar a gamers negrxs o que elxs pensam sobre isso.
Meu amado Perfect Dark do Nintendo 64, também foi alvo de censura de sangue. A versão japonesa corta o sangue e faz os cadáveres dos inimigos desapareceram rapidamente. Nas demais versões (por sorte, eu tenho uma delas :D), o sangue é presente (bem presente!) e os cadáveres demoram mais tempo para sumir. Faz realmente alguma diferença eu atirar na cabeça de um inimigo, ele cair no chão, e sair ou não sair sangue? O ato de matar é menos pior do que sangue? Cadê a lógica?
Outro jogo de sucesso, Shenmue 2, apresentava Yuan, uma personagem
travesti. Na versão japonesa, Yuan tinha uma voz masculina, e Dou Niu (um
antagonista) diz que Yuan é "seu namorado". Mas a empresa Sega da
Europa achou isso "inadequado" e colocou Yuan com voz feminina, e
qualquer menção de seu "gênero masculino" foi retirada.
Há certa ignorância e um grande preconceito vindo tanto
dos japoneses quanto dos europeus. Se Yuan é uma travesti, seu gênero é
feminino. Sua identidade deve ser respeitada. E a sede europeia da Sega teve
uma atitude muito transfóbica. Ah, pelamor! Ver uma mulher com voz masculina é tão
ameaçador? Engraçado que nem os personagens do jogo fazem comentários
transfóbicos (tirando aquela frase do Dou Niu). Se eles não fazem, então por que os jogadores deveriam?
Paper Mario: The Thousand-Year Door, também teve
um caso de transfobia. A personagem Vivian, uma bruxinha feita de sombra, é
declarada nas versões japonesa e algumas europeias (espanhola, francesa) como
uma mulher trans. Embora alguns personagens afirmem (preconceituosamente) que
ela é "na verdade" homem, Vivian se impõe e no final consegue que
suas duas irmãs reconheçam sua identidade. Na versão americana do jogo,
qualquer referência a transexualidade é retirada.
Visto que o jogo é mais moderno, vemos que a Europa até que
melhorou. Mas os Estados Unidos mostraram-se transfóbicos. Não importa que seja
um jogo mais infantil. Nenhuma criança ou adolescente vai sofrer um colapso ao
descobrir que existem pessoas trans. Até quando as pessoas vão tentar esconder
a diversidade? E só para constar, Vivian sempre foi
e sempre será uma das minhas favoritas.
Descobri sobre a transexualidade anos depois, e mesmo ainda ignorante não tive problema em aceitar a personagem como ela é. Viu? Mente de criança
consegue aceitar novas coisas. Ainda mais quando não é contaminada com
preconceitos. ^^
O polêmico South Park: The Stick of Truth, baseado na polêmica série South Park, foi alvo de censura na Europa e Austrália por conter sondas anais alienígenas e uma cena de aborto. Ok... todo resto é permitido então, incluindo as piadas racistas de Cartman e uma cena de sexo explícita? Não faz muito sentido. Além disso, o jogo herda o humor negro presente na série, e entramos na discussão controversa sobre os limites do humor (não estou julgando o jogo e a série de forma alguma).
O polêmico South Park: The Stick of Truth, baseado na polêmica série South Park, foi alvo de censura na Europa e Austrália por conter sondas anais alienígenas e uma cena de aborto. Ok... todo resto é permitido então, incluindo as piadas racistas de Cartman e uma cena de sexo explícita? Não faz muito sentido. Além disso, o jogo herda o humor negro presente na série, e entramos na discussão controversa sobre os limites do humor (não estou julgando o jogo e a série de forma alguma).
Censura é e sempre será um assunto polêmico e controverso, que pode variar de país em país, região em região. Embora tenhamos que respeitar as legislações de certos lugares, acredito que se for para censurar algo que ao menos tenha uma lógica. O objetivo aqui não foi mudar as leis da censura mundialmente, e sim apontar se há uma lógica nesses exemplos.
Eu penso assim: se um jogo tem conteúdo racista e homofóbico, não foi aprovado, e só a parte homofóbica foi retirada, também deveriam tirar a parte racista. Censuras seletivas e baseadas em preconceitos só refletem dois dos maiores maus da humanidade: ignorância e hipocrisia. O mundo dos games não é tão diferente da realidade...