19 de dez. de 2019

Comentando uma notícia

AC: lesbomisia, violência heterossexista.



Há uns dias uma mulher lésbica e direitista que apoiou o presidente atual foi vítima de agressão motivada por heterossexismo.

Com isso, houve muitas reações. Focando na comunidade, houve uma divisão entre aquelus que se solidarizaram e aquelus que debocharam.

Bem, posso dizer que jamais apoiaria mensagens de ódio e aplaudindo o ocorrido. Considero algo desnecessário, revanchista-punitivista, e anti-estratégico. Mas não dá pra controlar essas coisas. E o que me irrita ainda mais é que a direita utilizará bem essas reações para dizer o quanto "a esquerda" é a "verdadeira intolerante".

E vi muita gente indo pelo caminho "paz e amor", colocando a pessoa como uma ignorante, uma coitada, ou alguém que deveria ser acolhida e receber solidariedade da comunidade, contudo e apesar de tudo, mesmo sendo alguém que se posiciona tão contra a comunidade toda; que deveríamos ser "diferentes" da direita.

Vamos lá....

Eu defendo e sempre defenderei o direito dessa pessoa de ser lésbica e não ser vítima de qualquer violência heterossexista. Não defender isso e ainda aplaudir a agressão seria hipócrita e contraditório de minha parte. Ponto. Agora, não me peçam solidariedade e nem pra acolher alguém como ela. Guardo solidariedade e acolhimento pra todes que são vítimas desse sistema que até pessoas como ela reforçam e sustentam.

Nem acho que deveríamos levar pro lado de que ela não merece acolhimento ou solidariedade. Ela nem quer essas coisas da comunidade. É bobagem achar que dá pra ser uma alma iluminada com toda vítima de alguma violência. Se ao menos o ocorrido tivesse mostrado a realidade e dado alguma consciência a ela, mas as atitudes posteriores dela mostram que ela continua a mesma pessoa.

Acredito que o caso dela deveria ser encarado como um reforço de que heterossexismo é uma realidade e não escolhe lados políticos. Poderia ser alguma conscientização para quem está ainda alienade ou que engole as retóricas falaciosas da direita de que heterossexismo não existe.

Minha conclusão em poucas palavras é: apanhou, não deveria ter apanhado, continua sendo um lixo, foda-se. Força pra minha comunidade LGBTQIAPN+.

11 de dez. de 2019

Isso não faz parte da comunidade!

AC: pedofilia, menciona zoofilia e necrofilia.



Não é de hoje que surge aleatoriamente na vastidão da Internet uma mentira ultrapassada e ainda famosa: que há uma grande quantidade de pedófiles (usando o termo "pedossexual" ainda) reivindicando que são de uma orientação sexual marginalizada, e que, portanto, deveriam estar na comunidade LGBTQIAPN+; sendo acrescentades como um outro grupo da letra P (ao lado de poli e pan).

Muito bem. Por que pedofilia não é uma orientação sexual?

Bem, só são reconhecidas como orientações todas as atrações que envolvam gêneros e condições que as despertem. Da mesma forma que ninguém especifica orientação por determinada etnia ou por um tipo físico e outros exemplos problemáticos e questionáveis, uma atração definida por uma faixa etária não faz o menor sentido.

Mas o problema maior nem é esse. Pedofilia envolve o desejo por crianças e infantes; ou seja, pessoas incapazes de consentir para sexo e relações, e que nem são biologicamente maduras para tais atos. E, claro, querer envolvimento com esse grupo de pessoas é crime e nada além de abuso. E a comunidade jamais admitirá isso, sendo que todas as pautas sobre afetividade e relação são apenas sobre pessoas capazes de consentir e desenvolvidas para tais atos.

Nem toda pessoa pedófila vai cometer um abuso. Porém, esse desejo é um distúrbio e recai em práticas criminosas. Isso não tem lugar na diversidade. E o melhor que posso recomendar a pessoas assim é tratamento imediato.

Tudo que foi dito vale da mesmíssima forma para zoofilia e necrofilia. E, sim, também se espalha ocasionalmente por aí que praticantes desses outros dois distúrbios querem um "devido lugar" na comunidade. Não!

E quem espalha esses rumores? Bem, principalmente pessoas e grupos que odeiam a comunidade e tentam de toda forma desmerecê-la com mentiras e distorções. É de praxe que setores conservadores associem pessoas heterodissidentes e até pessoas trans com pedofilia; o que, na minha opinião, é mais uma projeção que fazem pra tirar a atenção dos inúmeros casos de pedofilia e abuso cometidos pelos ilustres "cidadãos de bem" ou "pais de família" ou "homens de Deus". E há muitos grupos organizados para criar "campanhas" (como incluir pedossexuais) através de contas falsas, utilizando conhecimento de propaganda e sobre a comunidade para parecerem convincentes.

Tais rumores atingem bem seu objetivo com parcelas da população que são alienadas e ignorantes sobre a comunidade e questões relacionadas, ainda mais quem já odeia a comunidade por simples convenção social. Mas há também pessoas da própria comunidade que fomentam esses rumores; geralmente pessoas "LGBT-" que são contra a inclusão QIAPN+ e acreditam que inclusões legítimas abrirão brechas para as parafilias, ou gente que também cai nas campanhas falsas de trolls e reaças.

Concluindo, aqui está uma explicação do por que esses distúrbios não fazem parte da comunidade, nem farão parte, e a comunidade jamais aceitará nada disso como parte da diversidade sexual e afetiva. Não caiam nesses rumores ou nessas campanhas ocasionais pela Internet. E quem tiver um ou mais desses desejos, recomendo que procure urgentemente ajuda psicológica.

25 de nov. de 2019

Conceito: orientação afinitiva e amativa

No começo do ano foram cunhados termos para falar de duas categorias de orientações: afinitivas e amativas.

  • Orientação afinitiva: descreve por qual ou quais gêneros você sente ou não atração. Temos como exemplos gay, lésbica, bissexual, panromântique, assensual, entre outros.
  • Orientação amativa: descreve como funciona sua atração. Temos como exemplos muitas orientações a-espectrais, como demi, gris, cupio, etc.

Podem ser conceitos úteis para separar melhor identidades de atração, e também para normalizar mais as orientações amativas, pois ainda é frequente que muita gente veja mais sentido ou validade em orientações que especificam atração por determinados gêneros.

Enquanto orientações mono e muitas orientações multi são essencialmente afinitivas, orientações a-espectrais, fluídas e indefinidas são amativas num geral. E, claro, assim como há identidades que podem ser multi e fluídas, há aquelas que podem pertencer às duas categorias (ex: duo).

30 de out. de 2019

Série: Pose


Esta série estava na minha lista de "séries LGBT+ que preciso ver" há um bom tempo. E então a primeira temporada foi disponibilizada na Netflix. Não aguentei esperar e fui conferi-la. Foi uma ótima decisão minha.

Pose trata de váries personagens da comunidade e suas vivências, seja suas relações entre si, seja sob a marginalidade. Alguns exemplos marcantes são Damon, um rapaz gay expulso de casa; Blanca, uma mulher trans que decide criar sua própria família de pessoas à margem; e Elektra, outra mulher trans e soberana nos bailes noturnos. Falando nisso, os bailes são um grande destaque na trama. Em meio a tanto sofrimento e conflito, a comunidade local criou seu próprio espaço e evento, onde pessoas das várias Casas (famílias) competem em desfiles de roupas, performances e danças.

Posso dizer que a história deu uma ênfase maior nas vivências das mulheres trans, mostrando conflitos geracionais, questões internas e familiares, e a vida noturna da prostituição. As mulheres da história tomam muito o palco, e com toda razão. Outra questão que tem alguma atenção e influência é sobre a epidemia do HIV da época; não falando do tema de forma estereotipada e trágica, mas contextualizando e trazendo o olhar da comunidade.

Entre seus momentos tristes e as desavenças internas da comunidade, Pose também consegue mostrar lindamente a resistência da comunidade ao manter-se unida, ao se apoiar, e aprender a enfrentar as dificuldades. Podemos ver o crescimento de cada personagem, com seus altos e baixos, e toda complexidade dos corpos dissidentes vivendo entre si e numa sociedade hostil e normativa.

A série é uma ótima retratação e antologia sobre a comunidade LGBT+. Sua primeira temporada é fantástica do primeiro ao último episódio. Todes deveriam assistir, em especial a comunidade. Que a série mantenha essa qualidade por todas as temporadas que vierem.

27 de out. de 2019

Quinto aniversário

Bem, eu meio que esqueci do aniversário do blogue, que foi dia 12. Nesse dia o blogue chegou ao seus cinco anos.

Não tenho muito o que dizer além de que minha experiência com o blogue foi muito boa. O blogue me fez crescer como pessoa e como ativista também. E me dá certo orgulho em saber que pessoas vêm aqui para se informar ou mesmo se entender.

Claro que não fiz tudo sozinhe. Tive ajuda e orientação de muita gente pra chegar onde cheguei. Ainda darei todos os devidos créditos. Futuramente.

Estive meio distante, como podem ver pelo número de artigos que estive escrevendo de uns meses pra cá. Faz parte. Estive focando em outras coisas, como o novo blogue.

Pensei que deixaria o blogue acabar esse ano. Mas decidi que não. Ainda o manterei por um tempo. Ainda assim, sinto que a hora está próxima. Provavelmente manterei meus textos no novo blogue, no Medium, e mais algum outro espaço.

Enfim, parabéns ao blogue e a mim como sue criadore, autore e administradore.

E a todes que apreciam meu conteúdo, muito obrigade! ♥️

17 de out. de 2019

Onde está meu gênero?

Vocês já se perguntaram onde está o gênero de vocês? Ou já te perguntaram isso? Ou já viram essa pergunta ser feita a alguém?

É uma pergunta que pode parecer muito interessante ou só "falta do que fazer". Pode ter gente que a jogue na cara de pessoas trans/n-b como uma tentativa de invalidá-las ou confundi-las.

Para o cis-tema, o gênero é biológico e definido por uma genitália. E se alguém me disser que seu gênero está no meu das pernas, bem, eu seguro a risada e vou fazer alguma coisa útil.

Gráficos sobre identidade de gênero parecem ter entrado num acordo de que o gênero reside exclusivamente no cérebro, na mente. Hm, será?

Esse "senso comum" parece ter alguma coerência, pois as experiências trans revelaram ao mundo que o gênero, para esse grupo, sempre foi algo além da genitália e muito ligado à simples autoidentificação. Ainda assim, talvez esteja simplificando demais. Estudos de gênero compreendem gênero como algo influenciado também por cultura e questões sociais de época e região.

Bem, considerando as infinitas experiências e perspectivas e subjetividades que decidi responder sobre *meu* gênero. Por isso o título do artigo não é "Onde está o gênero?". Minha resposta pode parecer meio "acadêmica", mas é o que me faz sentido.

Talvez minha resposta seja a mesma de outras pessoas, talvez ela ofereça uma resposta a alguém, talvez ela inspire alguém que nem pensou nessa questão.

Eu vejo gênero como uma característica biopsicossocial. E para mim faz todo sentido dizer que meu gênero está nos meus corpos biológico, psicológico e social. Meu gênero reside simultaneamente nesses três aspectos, que são interligados e que se "misturam" em meu ser.

Meu corpo físico está de acordo com minha identidade; sendo assim, tudo no meu corpo é de um corpo trans não-binário, incluindo meu bigode e meu pênis.

No meu corpo psicológico está toda a subjetividade da minha identidade, toda construção dela, minha autoimagem, autopercepção.

E no meu corpo social estão minhas experiências de vida e meu posicionamento na sociedade, construída numa base ocidental que impõe dois gêneros a todas as pessoas.

Essa é minha resposta.

E você? Onde está seu gênero?

22 de set. de 2019

Guarda-chuva bi

AC: reducionismo identitário



O "guarda-chuva bi" é um conceito que ainda gera discussão entre pessoas bi e multi num geral. Vim aqui apenas trazer uma breve reflexão sobre ele.

Como a definição geral de bi é atração por dois ou mais gêneros, temos aí abertura para todas as possíveis expressões de atração por mais de um gênero.

A comunidade bi se propôs desde sua fundação a englobar todas as atrações que não fossem exclusivamente por um gênero, mesmo que muitas pessoas tenham dado ênfase a homens e mulheres (não-binariedade ainda não era tão conhecida ou considerada).

Devido a essa definição, muitas pessoas e fontes preferem falar num guarda-chuva bi, colocando todas as possíveis identidades multi como dentro de bi. Isso, claro, gera controvérsias.

Por um lado, há pessoas que não se incomodam em dizer que estão sob esse guarda-chuva porque a definição de bi as englobam. Por outro lado, há pessoas que se incomodam por parecer que elas são "subtipos" de bi ou "basicamente bi".

Entendo ambos os lados. Talvez tudo dependa mais do sentido e contexto em que usam esse conceito. No entanto, eu sou uma das pessoas que prefere usar multi para todas as atrações por mais de um gênero.

Ainda vejo alguma necessidade em usar o guarda-chuva bi para incluir identidades em espaços (aparentemente) predominados por pessoas bi, ou para incluir todas as muitas identidades em denominações usadas em políticas (como políticas públicas que utilizam ainda "LGBT"). Mas são circunstâncias mais políticas e que, no fim, podem ser mudadas também.

A dinâmica com bi e outras identidades multi parece ser um tanto diferente da dinâmica das atrações a-espectrais (assexualidade e o espectro assexual, por exemplo). Ainda existem grandes conflitos entre pessoas bi e pan e com pessoas que defendem que apenas bi é suficiente como identidade política e pessoal.

Talvez esteja na hora de revermos melhor esse conceito e começar a substitui-lo por algo que não abre margem para controvérsias. E o termo multi, enquanto categoria, parece ter resolvido essa questão. Por isso recomendo multi.

Em todo caso, quem ainda prefere falar no guarda-chuva bi por algum motivo tem obrigação de respeitar a autoidentificação de todes. É o mínimo a se fazer, até em respeito às pessoas que fundaram a comunidade bi pensando na pluralidade de atrações.

11 de set. de 2019

Censuras

AC: censura, heterossexismo e cissexismo, criminalização, impunidade.


Dentro de uma semana tivemos duas grandes polêmicas envolvendo censura de conteúdos sobre diversidade. A primeira foi quando o governador de São Paulo mandou recolher materiais didáticos de escolas públicas com conceitos de sexualidade e gênero. A segunda foi na Bienal, ocorrida no Rio de Janeiro, quando o prefeito mandou que fossem confiscadas obras com temática LGBT+.

Confesso que nem achei os materiais didáticos bons, pois colocaram as concepções equivocadas de sempre; porém, antes tendo isso nas escolas do que todo tema de diversidade continuar sendo apagado. O governador, que deveria se preocupar mais com a qualidade de ensino e os recursos das escolas, ainda fez aquele discurso típico de reaça de ser contra a "ideologia de gênero".

E então teve a Bienal, que acho que nem preciso comentar sobre os acontecimentos, afinal foi a notícia que mais repercutiu na semana, sendo até capa da Folha.

O que eu gostaria de abordar aqui são as circunstâncias, colocando ambas situações lado a lado.

Não vou desmerecer a ação em si de Felipe Neto, pois ela foi muito boa e acredito nos efeitos positivos a longo prazo. O que me incomoda é o fato dos materiais didáticos, os quais seriam direcionados a jovens estudantes de classes socioeconômicas baixas (classes sem muitas condições de comprar muitos dos livros da Bienal), não ter causado a mesma repercussão e o mesmo nível de protesto e reação contrária.

E não para por aqui: não tivemos em nenhuma das situações qualquer mínima ação oriunda da criminalização da "LGBTfobia", que muites consagraram e confiaram na eficiência esperada. O prefeito de RJ poderia ter sido preso a qualquer momento. Não foi. E as tentativas de confiscamento ocorreram por dois dias seguidos, com aval prévio do próprio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

Quando o STF suspendeu essa ação, tivemos mais um crime cometido pela prefeitura: uso de notícias falsas para reforçar os motivos da fiscalização. Usaram a foto de um livro paródico que nem era daqui (tem uma etiqueta com valor em euros na própria foto!). O prefeito de RJ continua livre. 

Lembro de ter feito muitas ressalvas sobre a criminalização da "LGBTfobia". Bem que foi avisado que nada mudaria. Acabamos de ter a prova.

Felizmente, houve resistência!

A Justiça ontem deu prazo ao governador de SP para devolver os materiais recolhidos. O prazo termina amanhã. Vamos ver no que se dará. Mas já sabemos que não poderemos contar com a tal da criminalização.

Esses casos gravíssimos de censura e as circunstâncias só comprovam ainda mais o cenário desesperador da comunidade LGBTQIAPN+ brasileira: desamparo total pela própria lei. E isso só enfatiza do quanto necessitamos de mais corpos dissidentes nas áreas jurídicas e legislativas (bem, enquanto vivemos sob esse sistema). Ainda assim, o povo resistiu. Só precisávamos ter também investido mais energia contra a situação de SP; pois atacar o ensino básico reverbera em toda a sociedade.

Seguimos sendo resistência, seja contra prefeituras e governadorias, seja contra gente do próprio sistema judicial parcial e reaça que temos.

4 de set. de 2019

Fatos sobre a comunidade bi

AC: monossexismo.



Setembro é o mês da visibilidade bi. Interessante notar que visibilidade tem "bi" no meio. Por isso deveria ser mês da visiBIlidade apenas.

Tá, piadinhas (sem graça) à parte, vim aqui só pra dizer uns fatos sobre a atração bi e pessoas bi:



- Bi é atração por dois ou mais gêneros, e isso desde 1990

- Pessoas podem ser bi e não se atrair por homens e/ou mulheres

- Pessoas bi podem ter preferência por um gênero

- Bimisia existe e monossexismo é uma opressão estrutural

- Bi não é uma identidade conflitante com pan

- Existem pessoas bi monogâmicas e pessoas bi não-monogâmicas

- Existem pessoas a-espectrais e bi

- Existem pessoas fluídas que podem ser bi

- Existe casal bi <3

- Pessoas não-binárias podem ser bi

- Há pessoas que antes de se descobrirem bi se entendem como mono, e não há problema nisso

- Não há como provar que alguém não é bi (#polêmica)

- Leitura bi existe, mas não de uma forma positiva

- Ficar bêbade na baladinha e beijar todo mundo por diversão não te faz bi ;)



Outros textos que indico para um maior aprofundamento:






31 de ago. de 2019

Mudança

Dessa vez não falo de mudanças no blogue ou mudanças internas. Falo de mudança de casa rs.

Recentemente minha avó me propôs ficar morando um tempo aqui na nossa casa de Peruíbe, a mesma casa onde morei de 2002 a 2005, na cidade onde tive a melhor parte da infância.

Como São Paulo não me oferecia mais nada de novo, aceitei logo a proposta.

Deixei mis gates e algumas pouquíssimas amizades na grande selva de concreto, mas não tenho motivos para luto ou tristeza. São Paulo me saturou e eu não encontrava felicidade lá. Minha vida estava bem estagnada.

Claro que uma cidade litorânea com cara de interior não tem as mesmas oportunidades e a mesma agitação de São Paulo, mas não posso reclamar daqui. Tenho tudo que preciso para uma boa estadia e para começar enfim a planejar meu futuro.

Eu tenho meus planos pra cá, e um deles envolve trazer ativismos. Se isso será possível ou não, ainda não posso dizer. Preciso avaliar com calma o cenário daqui, se há demandas, meus limites, enfim.

Também não sei dizer se irei criar raízes aqui ou não. Tenho intenção de voltar para São Paulo futuramente. Tudo vai depender de como as coisas vão prosseguir aqui. Se tudo der muito certo, quem sabe?

Mudanças são sempre momentos bem emotivos. Com certeza estou ansiose, talvez com um pouco de receio do que está por vir. Mas também estou bem animade e motivade a realizar coisas aqui. E eu não sentia essa animação e motivação em São Paulo. Penso que aqui será uma fase de me reenergizar e me reorganizar.

Veremos o que posso trazer para Peruíbe e o que Peruíbe trará para mim.

27 de ago. de 2019

Digam suas linguagens pessoais

AC: cissexismo e exorsexismo estruturais, maldenominação.



Quando falo em linguagem pessoal me refiro à linguagem com a qual nos tratamos e expressamos, parte de nossa expressão de gênero. Ou seja se você é uma pessoa que usa o/ele/o, a/ela/a, ambos, sintaxe neutra, ou demais conjuntos fora das normas. 

Muitas pessoas trans já falaram e repetiram várias vezes o quanto é importante todes nas redes sociais normalizarem uma cultura de dizer suas linguagens pessoais, não importa o nome ou a aparência ou o gênero declarado/conhecido.

E todes também inclui pessoas cis; em especial pessoas binárias (cis, trans, ipso).

Vivemos ainda numa sociedade que pré-determina na socialização as linguagens o/ele/o ou a/ela/a dependendo do sexo/gênero designado de um bebê. E, quando o "sexo aparente" não é suficiente, a linguagem é pressuposta pela aparência; que a sociedade classifica só em feminina ou masculina, ainda assim mantendo um exorsexismo estrutural na língua.

Pessoas são pressupostas como cis o tempo inteiro, por mais não-conformistas de gênero que sejam. A sociedade opera como se não fosse necessário especificar um pronome ou a flexão de gênero nas palavras que usamos; afinal é "sempre óbvio".

É justamente tudo isso que precisamos combater. Essa ideologia cissexista (e muito exorsexista) de que as linguagens são óbvias, que basta olhar para a pessoa para saber, que está tudo bem pressupor como você deve tratar alguém.

Até porque, por mais que pessoas cis e pessoas trans binárias com "alta passabilidade" estejam num lugar de conforto, muitas outras pessoas não estão. E ainda existe toda uma estrutura que alveja todas as pessoas trans binárias também. Há homens e mulheres trans, por mais passáveis que sejam, sendo maldenominades unicamente por causa de seu gênero designado.

Não é uma questão que pesa somente em pessoas não-binárias que usam neolinguagens ou mesmo as linguagens padrão, mas também em pessoas trans sem a tal da passabilidade cis.

Especificar sua linguagem pessoal ajuda a naturalizar que:

- linguagens pessoais são características importantes e relevantes de serem sabidas;
- as linguagens não são (e nem devem ser) "óbvias";
- qualquer pessoa pode usar qualquer linguagem;
- e que pode haver mais opções além de o/ele/o e a/ela/a.

Recomendo muito o modelo APF de linguagem que uso aqui no blogue e que está começando a ser mais adotado pela comunidade trans/n-b. Mas admito que já senti algum alívio só de ver homens e mulheres cis colocando "ele/dele" ou "pronome ela" em suas descrições de perfil, que é melhor que nada. Ainda assim, o modelo APF é melhor e mais preciso.

Quanto mais pessoas aderindo a isso, mais vamos abrindo um caminho de tolerância e respeito para pessoas cisdissidentes e lutando contra o CIStema. Se você for cis e se pergunta como ser aliade da causa, aqui está algo simples que pode ser feito.

21 de ago. de 2019

Termos juvélicos

Os termos juvélicos são identidades criadas para definir atrações e relações sem precisar usar categorias específicas de atração (sexual, romântica, etc), tendo sentidos mais amplos (ou até mais específicos) e sendo mais inclusivas.

Aqui no blogue já comentei sobre os termos aquileane, sáfique, enebeane e duárique. Acredito que podem ser os termos mais comuns de serem usados em contextos mais gerais. Mas, para todes que quiserem, na tabela abaixo haverão muitos outros termos.

A tabela funciona da seguinte maneira:

- Na coluna vertical à esquerda está a identidade de gênero.
- Na primeira linha horizontal está o alvo da atração.
- Basta localizar então qual termo juvélico condiz com a identidade e a atração que você procura.

Na tabela logo abaixo de cada termo há siglas que indicam "[gênero] atraíde por [gênero]". H para homem, M para mulher, e NB para não-binárie.

Nas células de gênero com mais de uma identidade (homem e mulher, etc) se referem antes de tudo a pessoas não-binárias, que podem ter mais de um gênero ou fluir entre eles. Mesmo que possam se dizer apenas n-b, para algumas pessoas é importante e relevante um termo que indique se são homem e/ou mulher e de algum gênero não-binário.

E nas células com "mulher e não-binária" e "homem e não-binária" podem se referir também à pessoas que se identificam como homens não-bináries ou mulheres não-bináries, não apenas a alguém que seja de um gênero binário e outro(s) não-binário(s).

Há outros termos cunhados além desses, mas por ora só falarei desses.


Deixo logo abaixo cada termo com seus significados (em ordem alfabética):

Agátique: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Alexandrítique: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Ametriane (ou Amólique, Braunitiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Amólique (ou Ametriane, Braunitiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Anfisiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Asteriane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Asterosiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Astroidiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Astrônique (ou Marmórique): uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Aquileane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) homens.

Auriane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Aventuriane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Axinitiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres.

Azuriane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) homens.

Benitoitique/Benitoítique: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Braunitiane (ou Ametriane, Amólique): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Calistiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Carneliane: uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Cianitiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Citriniane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Coruscanteane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Diamantiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) homens.

Dórique (ou Quadrisiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens.

Duárique: uma pessoa que é (pelo menos) homem/mulher e atraída por (pelo menos) mulheres/homens.

Enebeane: uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Escapolitiane: uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Espineliane/Espinéliane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Fluoriane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens.

Hecatolique/Hecatólique: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Iolitiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Iridiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Jaspiane (ou Versiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Julietiane (ou Duárique): uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) homens.

Labradoriane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Lapiane (ou Lutecitiane): uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Larimariane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) mulheres.

Litiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) mulheres e pessoas não-binárias.

Luminiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Lutecitiane (ou Lapiane): uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Marmórique (ou Astrônique): uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Morganitiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres.

Opaliane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) homens e pessoas não-binárias.

Orbisiane (ou Trízique): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres.

Peroliane: uma pessoa que é (pelo menos) homem, mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Quadrisiane (Dórique): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens.

Romérique (ou Duárique): uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) mulheres.

Roquileane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Rubiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e não-binária e atraída por (pelo menos) homens.

Sáfique: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) mulheres.

Salietiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) homens e mulheres.

Serendibitiane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Tafeitiane: uma pessoa que é (pelo menos) mulher e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

Topaziane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e mulher e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Trízique (Orbisiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres.

Turqueane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) pessoas não-binárias.

Umbaliane: uma pessoa que é (pelo menos) homem e não-binária e atraída por (pelo menos) mulheres.

Versiane (ou Jaspiane): uma pessoa que é (pelo menos) não-binária e atraída por (pelo menos) homens, mulheres e pessoas não-binárias.

30 de jul. de 2019

Neolinguagem: pronomes demonstrativos

Cá estou trazendo algumas ideias novas sobre possíveis neolinguagens.

Hoje falarei sobre pronomes demonstrativos, outra classe de pronomes que não vejo em discussões envolvendo neopronomes.

Os pronomes demonstrativos da língua padrão são:
  • este, esta, isto
  • esse, essa, isso
  • aquele, aquela, aquilo

Aqui focarei nos pronomes com estrutura [vogal]-ST/SS-[vogal].

Percebi há um tempo que há uma grande semelhança entre os pronomes pessoais e os pronomes demonstrativos impostos pela língua padrão. Falo em relação à estrutura:

Ele - Este, Esse
Ela - Esta, Essa

O que muda entre ambas classes de pronomes é apenas o que vem entre as vogais. No caso, é como se houvesse apenas a troca de L para ST e SS. Isso me fez pensar nos pronomes demonstrativos como transformações dos pessoais.

Decidi então aplicar essa lógica aos neopronomes pessoais. Não é uma ideia perfeita e comentarei suas limitações.

No sistema de neolinguagem que uso, e/elu/e, eu já usava desde sempre estu e essu, pensando em algo combinante com elu.

Aparentemente outras pessoas consideraram isso e pensaram em pronomes demonstrativos que combinassem com seus pronomes pessoais. Como não vi exemplos disso sendo comentados, vou colocar abaixo alguns exemplos:

Ile - Iste, Isse
Éli - Ésti, Éssi
Él - Ést, Éss
Elae - Estae, Essae
Ila - Ista, Issa
Ael - Aest, Aess
Ily - Isty, Issy

Pronomes seguindo uma estrutura com vogais (únicas ou sílabas) ou consoantes lidas como vogais (y, w) e com L "no meio" conseguem oferecer boas adaptações de pronomes demonstrativos.

Não é o caso de pronomes como eld e elz, que terminam em consoantes. E nem o caso de pessoas que usam emojis e símbolos como pronomes pessoais.

Em relação a todes que usam ilo, essa proposta implicaria a elas o uso de isto e isso, que já existem  Não sei o quanto as pessoas se sentiriam confortáveis em usar isto e isso para si, visto que são pronomes muito usados para objetos e coisas abstratas, apesar que seu uso seria diferente dessas situações. Mesma coisa no caso de ilu.

Essa proposta serve para pessoas terem pronomes demonstrativos mais fáceis de se deduzir, e talvez que soem mais agradáveis por serem similares aos pessoais. Mas nada que seja obrigatório também. 

Para os casos em que não funciona a troca de L para ST/SS, pode-se escolher alternativas como estie e essie. Pessoas podem optar por pronomes semelhantes, como éste e ésse, se acharem "estranho" ést e éss por não terem nada no final.

Enfim, deixo aqui essas minhas ideias.

20 de jul. de 2019

Game: Undertale

(Descrição de imagem: uma tela preta com o título Undertale escrito em branco. Na letra R, em sua parte aberta, um coraçãozinho vermelho. Fim da descrição.)

Consegue imaginar um jogo com uma criança não-binária que cai num mundo de monstros, com uma história cheia de referências de RPG, e com a opção de ser ume salvadore ou ume destruidore? É assim que começo a falar sobre Undertale, lançado em 2015 e criado por Toby Fox.

A história é sobre uma criança humana chamada Frisk, que um dia decide escalar uma montanha, e acaba caindo numa caverna. Lá é o mundo dos monstros, isolados tempos atrás da humanidade e por uma barreira mágica. O objetivo principal de Frisk é sair daquele mundo. Como elu fará isso, depende de quem está jogando.

Existe toda uma mitologia por trás daquele mundo, que pode ser explorada em todas as rotas, mesmo com algumas diferenças. Sua interação com es personagens vai construindo seu trajeto por aquele mundo, que possui cenários bonitos e, mesmo não sendo tão grande, pode te proporcionar algumas boas horas de exploração. Mesmo sendo mais linear, o jogo te oferece muitas opções fora do objetivo principal, que acabam influindo na rota e em qual dos muitos finais você conseguirá.

No jogo é possível seguir 3 rotas: Pacifista, Neutra e Genocida. Apesar do formato típico de RPG, que geralmente te direciona a vencer inimigues para ganhar experiência e poder, Undertale possuiu fortes mensagens sobre a moral de alguém. O tempo todo você tem escolhas; poupar inimigues é uma delas. Suas escolhas refletirão sua moral. E, claro, suas escolhas terão consequências.

Quer testar os limites da sua moral? Quer descobrir o que significa EXP e LOVE? Quer uma aventura dinâmica que te permite explorar o mesmo mundo sob vários ângulos? Undertale é minha recomendação. Bônus: tem personagens queers.

16 de jul. de 2019

Proposta de bandeira

Recentemente fui na reunião de um coletivo que engloba corpos marginalizados em geral. Foi apontado que não existe uma bandeira de orgulho de pessoas gordas.

Pesquisei e confirmei. Não existe! (que absurdo)

O que achei em minhas pesquisas foi apenas uma bandeira de fetichismo por pessoas gordas (polêmica, mas aparentemente com uma aceitação considerável).

Pois bem. Tive umas ideias para uma bandeira de orgulho gordo, que acredito que possa também representar a positividade corporal em geral. Embora eu não seja gorde, positividade corporal me diz respeito e me senti na liberdade de propor algo.

Minha proposta:

(Descrição de imagem: uma bandeira composta por três faixas horizontais seguidas e um círculo branco na faixa do meio. As cores são, de cima para baixo; rosa, laranja, e amarela. Fim da descrição)

Simbolismo da bandeira:

Rosa: amor; em especial, o amor próprio.
Amarelo: a positividade (corporal).
Laranja: junção dessas qualidades, também motivação e encorajamento.
Círculo branco: unidade, perfeição, e totalidade; aqui representando também que todas essas qualidades estejam sempre infinitamente dentro das pessoas.

Recebi opiniões positivas. Estarei aguardando por mais opiniões, principalmente de outras pessoas gordas e do ativismo gordo/de positividade corporal. Era só isso.

Mesmo que não seja amplamente aceita, estou feliz com meu trabalho.

Quem tiver opiniões e sugestões, por favor comentar ou entrar em contato comigo.

6 de jul. de 2019

Em defesa da identidade abro

AC: exclusionismo, reacionarismo, discursos e ações contra fluidez de atração.



Essa semana o Twitter provou mais uma vez ser um espaço nada seguro e de reacionarismo contra as microcomunidades (aquelas com identidades mais incomuns ou bem específicas). A vítima dessa vez foi a abrossexualidade; a orientação abro.

(pra quem quiser conferir esse horror, apenas digite abrossexual na pesquisa do site)

Saí em defesa da identidade, apoiei pessoas sendo atacadas, fui atacade, bloqueei muites exclusionistas, enfim, uma semana bem estressante. Nem parece que semana passada era o tal mês do tal orgulho da tal comunidade LGBTQIAPN+.

Assim como no Twitter decidi escrever sobre essa identidade aqui também. Aqui é um espaço de respeito e tolerância às microcomunidades, afinal.

(Bandeira abro)

Primeiro de tudo, a definição (que muita gente não entendeu ou distorceu de propósito):

(definição com minhas palavras, mas ainda coerente)

"Uma atração muito fluída; a pessoa pode fluir entre orientações, sentir-se de orientações diferentes em períodos diferentes."

Em nenhum momento foi dito que a pessoa pode conscientemente escolher sua atração. A fluidez presente e característica dessa identidade é involuntária e natural; apenas acontece.

E, como foi dito, a pessoa se sente de orientações diferentes. Ora, não separamos as atrações por um, mais de um, e nenhum gênero por nomes? Não cria-se uma ideia clara de cada uma? Enquanto muita gente permanece em alguma dessas orientações, uma pessoa abro muda entre duas ou mais delas.

Como poderíamos resolver o impasse de alguém com uma atração assim? Deixá-la se dizer de orientações diferentes em tempos diferentes? Ou cunhar uma identidade focada nesse aspecto? 

Qualquer ume com bom senso suficiente saberia que na primeira opção haveria muitos ataques. Afinal a comunidade não aceitaria alguém se dizendo hétero, depois não-hétero, e hétero de novo, e assim por diante. Né?

Vi muita gente resumindo essa orientação em apenas bi ou pan. Principalmente, bi.

A questão é que uma pessoa abro teria períodos em que sua atração poderia sim ser descrita como bi ou pan. E, em outros períodos, não. Como exigir que a pessoa adote duas identidades tão bem definidas que, num dado momento, não a descrevem?

Já conheci uma pessoa que tinha períodos entre ter atração exclusiva por homens e ter atração exclusiva por mulheres. Poderia se dizer bi? Talvez. Se lhe fizesse sentido. Agora, sinceramente, nunca vi cogitarem incluir uma pessoa com esse tipo de atração na definição de bi. Até porque atrações fluídas - e percebi isso melhor essa semana -, ou nem são consideradas ou são atacadas fortemente.

E aliás, a Internet brasileira ainda nos faz o imenso desserviço de espalhar uma definição antiquada de que bi é atração por homem e mulher. E passam a ideia de ser algo constante. Como convencer uma pessoa que terá períodos de atração por muitos gêneros de que bi/pan a inclui? E como exigir isso quando a atração é inexistente?

Aquele velho discurso de a sexualidade humana é fluída foi... sabe-se lá pra onde foi.

O que realmente separa uma pessoa abro de pessoas das orientações mais "populares" é a constância da atração. Pessoas bi e pan se sentirão bi e pan o tempo todo, por mais que tenham preferência, por mais que a atração possa mudar a intensidade. Uma pessoa abro, não.

Está certo que microcomunidades não têm uma boa divulgação aqui no Brasil. Porém, mais uma vez, a maioria parece não querer sair de uma bolha e tentar ao menos compreender identidades menos conhecidas. E não é surpresa que os mesmos discursos feitos contra abro poderiam ser usados contra pessoas pan e a-espectrais. De fato, teve pessoas aproveitando a onda para fazer isso.

E pessoas abro podem adotar junto as orientações mais conhecidas, ou se apresentar com elas dependendo do espaço, considerando a orientação que identificam no momento, ou qual orientação costuma ser mais presente em suas vidas. Não é incomum as identidades menos conhecidas acompanharem as identidades populares.

Ainda acho que abro deveria ser também uma identidade popular, junto com a atração pomo. Creio que muita gente se encaixaria numa identidade fluída e numa identidade indefinida, já que nem todes têm uma atração constante e perfeitamente descritível nos conteúdos mais aceitos e divulgados.

Por isso também que o argumento de que confundiria pessoas se descobrindo é falho. Até parece que não existem pessoas fluídas desde sempre. E mais, se a pessoa depois vier a se descobrir melhor e não for abro, ela apenas deixa de se identificar como tal. Uau! Que simples, não?

Para finalizar: a orientação abro é válida, deve ser respeitada, não invalida orientações multi, e definitivamente não contribui com a opressão vivida pela comunidade LGBTQIAPN+. Quem quis entender ou rever seus conceitos, ótimo. Reaças da comunidade, queimem. Beijos de luz.

24 de jun. de 2019

Parada LGBT 2019

AC: silenciamento e exclusão, situações envolvendo crimes e violência.



Mais uma vez decidi me aventurar nesse evento controverso: a Parada LGBT(+?) de São Paulo. E por que raios fiz isso após toda desgraça das paradas anteriores (furto, bolo, colega inconsciente jogado pra fora do trio)? Bem, razões puramente políticas, tudo apenas por uma militância na qual acredito.

Nem me refiro ao cenário político atual, que, com certeza, deve ter deixado muita gente acuada. Agora depois de todo desastre e da incompetência descomunal do novo (des)governo, e após a criminalização da homofobia/homotransfobia/LGBT(I)fobia (não sei dizer com precisão o que foi criminalizado rs), a população LGBT+ pode ter dado uma relaxada e ido curtir com mais prazer a (suposta) maior Parada do mundo.

Bem, aqui falarei dentro dos âmbitos pessoal e militante: eu... gostei da Parada! Sério, de verdade, essa Parada deu certo e foi boa. Continuo não curtindo agitação, muvuca e música alta. Mas esse ano, assim como no anterior, foi diferente: fui no bloco do meu outro GT, o BiPanPoli+, que promoveu o bloco que, ouso dizer, era o mais diversificado e inclusivo e politizado do evento.

Como muitos espaços multi, nosso espaço tinha a proposta de englobar todes. E quando falamos todes, nos referimos a todes mesmo. Teve muita gente não-binária e a-espectral por lá. Foi tudo gostoso, andamos de boa, e fomos marchando com muitas bandeiras e faixas - incluindo uma faixa sobre estarmos resistindo ao silenciamento; uma indiretinha pra uma certa organização que faz um certo evento que até hoje silencia pessoas multi e favorece mais o segmento G.

O situação é tão grave que minha motivação (e talvez do resto do bloco) era muito mais a resistência e representação dentro da própria comunidade do que fora dela. Já temos um governo fascista e um mundo hostil, e ainda precisamos conquistar espaço dentro de grupos ditos LGBT(+?).

Sem entrar em mais detalhes, eu amei estar naquele bloco. Foi melhor que estar no trio da Parada anterior. E mais uma vez esse GT se mostra como mais contemplativo pra mim e mais alinhado com o que acredito.

O que eu teria mais para comentar seriam... bem, os problemas de sempre e mais outras coisinhas.

Como todo ano, rolam furtos, assaltos, brigas e ocorrências. No entanto, me pareceu que esse ano se intensificou e a segurança estava ainda mais falha. Muitas pessoas apontaram que o evento está cada vez trazendo mais e mais gente e não se prontifica a se preparar para esse número. Teve casos de pessoas desmaiando ou sendo esmagada em multidões. E casos de violência pesada.

E outra coisa que não pude deixar de notar foi em relação às atrações do evento. Tivemos muita gente cis hétero de fora da comunidade aparecendo e se apresentando em vez de pessoas da própria comunidade, o que ainda coloca em risco o propósito do evento. E teve a polêmica do camarote de Daniela Mercury, com um ingresso caríssimo e uma representatividade superficial.

Essas serão questões pra instituição da Parada. E ainda haverá muitas reclamações de quase todos os GTs, com seus devidos motivos de insatisfação.

Pra finalizar, um conselho: invistam mais em eventos como marchas trans, caminhada de mulheres sáficas, e etc. Esses podem compensar o que a Parada continua se recusando a fazer direito mesmo que por um dia. E pra quem quiser ver como foi o bloco, confiram no meu instagram.

Status: me sentindo orgulhose do meu GT e de mim mesme!

15 de jun. de 2019

Identidades problemáticas

AC: machismo, monossexismo, elitismo, capacitismo, trolls.



Eu defendo muito o direito das pessoas de se auto-identificarem como querem. E vou continuar defendendo. Não me apego a argumentos como que isso dificulta o entendimento das massas, a articulação do movimento, a inclusão em políticas públicas, etc.

Porém, claro que existem identidades que podem e devem ser questionadas quando possuem um viés problemático, ainda mais quando reforçam alguma opressão ou atacam alguém ou um grupo. Isso existe e costuma ser muito difundido de má fé no meio virtual.

Vou dar dois exemplos de identidades problemáticas e explicar o motivo de serem.

Goy (ou G0y): define um homem cis que se declara heterossexual, mas que pode ter relações sexuais com outros homens, tendo sempre um papel de ativo e sem envolvimento afetivo (apenas com mulheres).

Motivo: talvez eu nem precise explicar com detalhes o por que essa identidade é... ridícula. Mas vamos lá. É evidente o quanto a identidade parte de princípios machistas de reafirmação de "masculinidade", principalmente pela ideia de que ser ativo é um papel "de homem", o que, absurdamente, consegue isentar o cara de ser julgado mesmo transando com outros homens. E, por fim, o óbvio apagamento bissexual (não que todos realmente sejam, mas o fato de um homem ter relações sexuais com homens e mulheres e se dizer hétero já é um prato cheio pro monossexismo).

Sapiossexual: pessoa que sente atração sexual por pessoas inteligentes, cuja atração é despertada por inteligência, que se atrai sexualmente pelo intelecto de alguém.

Motivo: inteligência é um tanto abstrata e tem muita construção higienista envolvida. A ciência categoriza até então nove tipos de inteligência, que estão presentes em todes. O que muita gente encara como inteligência é mais uma demonstração da pessoa ser muito informada e ter raciocínio lógico rápido e amplo. Só nesse aspecto podemos refletir no quanto pessoas com pouco acesso à educação e pessoas com neurodivergências que afetam a capacidade cognitiva são automaticamente excluídas dessa tal atração por intelecto. Combo de elitismo e capacitismo.

Não podemos levar a sério também tuuudo que vemos por aí, ainda mais na Internet. Identidades absurdas surgem vez ou outra. E, infelizmente, muita gente cai nessas armadilhas de trolls e reaças que tentam deslegitimar as pautas da comunidade LGBTQIAPN+.

Há invenções tão banais que imediatamente mostram que são chacotas. E há outras (como sapio) que devem ser bem analisadas para revelar sua natureza problemática. Prestem atenção, tomem cuidado! E não alimentem trolls. ^^

11 de jun. de 2019

Modalidade de gênero

Descobri esses dias bem ao acaso no Medium um texto apresentando um novo conceito: modalidade de gênero. 

Formulado por uma pessoa transfeminina chamada Florence Ashley, o conceito serve para explicar a relação entre a identidade de gênero de alguém com seu gênero designado, levando em conta todos os fatores possíveis de influenciar essa relação.

Basicamente, as categorias de gênero - cis, trans, ipso, etc - são modalidades de gênero. Ainda é comum esses termos serem utilizados como se fossem a identidade de gênero em si ou parte intrínseca dela, sendo que são especificações da experiência pessoal de gênero da pessoa com o gênero imposto pelo sistema.

E o termo modalidade abrange outros grupos que podem não querer ou conseguir se encaixar como trans, que é o caso de algumas pessoas não-binárias e pessoas agênero.

Exemplificando o uso do conceito, um homem cis e homem trans são de modalidades de gênero diferentes, afinal suas relações com o gênero designado são diferentes, mas possuem a mesma identidade de gênero. Uma mulher cis e uma mulher ipso são de modalidades diferentes, pois mesmo que tenham a mesma identidade de gênero, o fator da corporalidade traz experiências diferentes com o gênero.

O conceito pode melhorar o vocabulário e as explicações referentes às experiências e discussões de gênero, sem cair na dicotomia cis x trans, incluir mais vivências (como de pessoas intersexo), e englobar as muitas culturas com noções diferentes de gênero.

Enfim, é um conceito muito útil e necessário. Passarei a adotá-lo e espero que sua divulgação seja ampla e que tenha ótima recepção.

Deixarei logo abaixo o texto e uma postagem de Florence explicando como cunhou o conceito (ambes em inglês):

6 de jun. de 2019

Tradução de linguagens

AC: exorsexismo, ações anti-neolinguagem.



Cá estou após um pequeno sumiço querendo abordar um assunto complexo, porém acredito que seja simples de explicar. E aqui quando falo de linguagens, me refiro às linguagens pessoais (e possivelmente universais), sejam pronomes ou conjuntos (como o modelo artigo/pronome/flexão que uso aqui no blogue).

Esses dias mesmo li um texto traduzido que falava de duas pessoas não-binárias transmasculinas indo numa praia. O texto fora escrito por uma delas. No final citava que ambas namoravam uma terceira pessoa, que foi referida como namorado. E também havia um adendo: a pessoa escreveu que tanto ela quanto a outra usavam pronomes they/them.

No entanto, o texto foi traduzido como se usassem a linguagem o/ele/o. Já escrevi um texto falando dessa questão complexa de traduzir ou adaptar um texto particular de uma pessoa que usa um pronome neutro (ou não associado com os gêneros binários) para uma língua como a nossa, com uma estrutura binária e sem um terceiro pronome/uma terceira opção de linguagem.

Como escrevi no texto e acho que comentei em algum artigo aqui, é possível usar o conjunto o/ele/o de forma "neutra", pois, gramaticalmente falando, esse conjunto é tanto masculino quanto neutro. E talvez por serem duas pessoas transmasculinas tenham achado mais adequado e sensato usar esse conjunto do que a/ela/a.

Mas a questão é que se essas duas pessoas optaram pelos pronomes they/them, então elas rejeitam pronomes "masculinos" (he/him). É uma atitude ética atribuir uma linguagem gramatical e socialmente masculina a essas pessoas?

Assim como escrevi no texto e acabo de falar, essa situação mostra um vácuo que temos entre uma língua binária como a nossa e uma língua mais neutra como o inglês.

Se não fosse permitido o uso de neolinguagem, a pessoa ou equipe que traduziu o texto poderia tentar a via da sintaxe neutra, evitando pronomes e flexões de gênero. Mas também compreendo que há textos difíceis de traduzir/adaptar dessa forma. Quanto maiores forem, mais exaustivo também. E isso não resolve nadinha o problema central aqui: a falta de mais opções de linguagem no idioma!

Neopronomes estão aparecendo em outros idiomas também. Em inglês temos ze, ve, ey, thon, entre muitos outros. Alguns mais conhecidos, outros não. Já li textos indicando que o pronome ze está tendo um crescente reconhecimento social.

E agora pergunto: como traduziremos esses novos pronomes? Vamos continuar separando todo mundo entre o/ele/o ou a/ela/a? Vamos usar sintaxe neutra pra todo mundo que não usa pronomes ou linguagens bináries? Vamos continuar fingindo que está tudo bem chamar de ele ou ela pessoas que usam they ou qualquer outro terceiro pronome de outros idiomas?

Por isso e outros motivos que acredito na validade e necessidade da neolinguagem. Não poderemos mais ignorar a limitação da nossa língua daqui a um tempo. Ou podemos até fazer isso e sermos reconhecides como uma língua exorsexista. Eu prefiro trabalhar por um futuro mais inclusivo.

28 de mai. de 2019

Negatividades

Estive refletindo há muito tempo em relação a toda negatividade a qual me exponho e que acabo também expondo aqui.

E a toda negatividade que eu e outras pessoas conhecidas acabamos nos expondo mesmo em nossos próprios espaços, cujas propostas são serem espaços seguros.

O mundo não é flores e doces. O mundo é fudido mesmo. Não tem como fingir o contrário, a não ser que você queira ser totalmente alienade e viver na própria cabeça (o que não resolverá seus problemas).

Não vou fingir isso e meu objetivo aqui não é transmitir uma mensagem superficial a nível de "pense positivo" ou de livro de autoajuda.

Às vezes essa negatividade nos atinge ao ponto de vivermos pra ela e falarmos apenas nela. Precisamos ter esse cuidado nas militâncias! Não é de hoje que falo isso, mas preciso me relembrar disso constantemente.

Nossa cabeça fica cheia, nos sentimos estressades e cansades, começamos a perder esperança num futuro melhor, e, se não tivermos saúde mental nem perspectiva, então nosso trabalho perde valor e sentido.

Acho que não podemos nos esquecer desses dois itens: saúde mental e perspectiva. E acredito que termos mais contato com positividades seja uma boa maneira de preservá-los.

Vou propor para mim mesme e para quem mais quiser o seguinte: 

Vamos ler mais coisas positivas. 
Vamos divulgar mais notícias positivas. 
Vamos escrever e espalhar mais frases positivas. 
Se possível, vamos nos isolar numa bolha só com positividades por horas ou um dia inteiro.
Se necessário, vamos só ter contato com positividades por um longo período, como um repouso.

Olhe pra si e diga coisas positivas sobre si.
Olhe para as pessoas e diga coisas positivas para elas.

É isso. 

Que você tenha um dia maravilhoso! E lembre-se: você é válide!

21 de mai. de 2019

Pessoas trans em mídias

AC: cissexismo, exclusão trans do mercado de trabalho.



Personagens trans estão cada vez mais sendo retratades nas mídias. Aqui comentarei especificamente sobre novelas, séries e filmes; mídias que necessitam de atuação.

Um fato comum e polêmico que ainda acontece muito na indústria dessas mídias é pessoas cis sendo escaladas para interpretar pessoas trans.

Quando isso é criticado, surge todo tipo de justificativa. Uma que já vi sendo muito usada é que "precisa de alguém pra representar a pessoa antes da transição". Algo risível se pensarmos nas possibilidades tecnológicas atuais (isso que há vezes que uma ótima maquiagem faz o serviço). E sem contar o reforço da ideia que toda pessoa trans quer fazer transição física.

Ainda existe muita desinformação sobre o tema da transgeneridade. É questionável o quanto as representações em obras atuais são realmente boas; ainda mais quando insistem em colocar uma pessoa que "odeia" o próprio corpo. Mas mesmo que a representação seja boa, quando acontece a premiação o ator que interpretou a mulher trans vai de terno e barba.

A comunidade trans carece muito de empregabilidade. Quando conseguem atravessar a escola e fazer faculdade ou curso, o que para muites é algo sofrível, o emprego não aparece. Não é por falta de gente disponível, gente formada na área.

Como a produção dessas mídias insiste agora em retratar personagens trans, mas não escala pessoas trans no elenco? Afinal, essa representatividade está servindo a uma causa ou apenas aos bolsos da produção? Há de se pensar nisso.

Considerando esses contextos, pessoas trans interpretando pessoas trans é uma necessidade imensa. Felizmente, acredito que houve uma ligeira mudanças. Só que não é suficiente.

Não digo que nenhuma pessoa cis possa interpretar pessoa trans. Se for escalada, o mínimo que a pessoa pode fazer é uma atuação digna e questionar seu local de privilégios. Ou mesmo enfrentar e recusar o papel, defendendo a presença de pessoas trans. (sonhar não dói, né)

Mas o ideal seria dar oportunidade às pessoas trans para atuarem em algo dentro de suas vivências e oferecerem representatividade durante e também após a obra. Queremos muito ver premiações com pessoas trans sendo indicadas ou ganhando.

Precisamos sim de mais pessoas trans atuando. Isso não é favor, é obrigação.

11 de mai. de 2019

Gosto é pessoal

AC: gordemisia, racismo, outras possíveis exclusões.




Muita gente já deve ter ouvido e falado que gosto é pessoal, geralmente como defesa. Nossas preferências são particulares e como tais devem ser respeitadas e não questionadas.

Linda teoria. Mas há sim o que se questionar.

Já vou avisando com antecedência que não estou acusando ninguém e nem obrigando alguém a ter relações com determinado grupo. Isso é um artigo de reflexão.

É bem comum em aplicativos de relacionamento pessoas escrevendo em seus perfis: não curto gordo/negro/afeminado/velho/etc.

Tem gente que declara com todas as letras, sem pudor algum, que não se atrai por todes que possuem determinadas características, ou ao menos que a atração é rara/pouco frequente.

Primeiro de tudo, é interessante apontar que, "por um acaso", os grupos que são alvos dessas afirmações são sempre aqueles com todo um histórico de marginalização, colocados constantemente como ausentes ou carentes de "beleza", ou "charme", ou "encanto", ou qualquer outra coisa subjetiva considerada atrativa.

Segundo, essas constatações são muito fortes, não? Quero dizer, como podemos afirmar que pessoas de determinado grupo jamais vão nos atrair? Quem percorreu o mundo inteiro pra confirmar que não consegue se atrair por nenhuma pessoa gorda, negra, etc?

Estamos falando de grupos com milhões de pessoas no mundo. E mais, como exatamente funciona essa seleção de atração baseada nessas características? O quanto um corpo precisa ter de gordura ou de pigmentação na pele pra ser ou não ser atraente, visto que todas essas características estão dentro de espectros imensos de variação?

Gosto é pessoal? Muito bem, não vou discordar. Mas não é estranho uma maioria ter os mesmos gostos? Não é estranho esses corpos ditos atraentes estarem representados em tantos lugares? Não é estranho num país tão diversificado como o nosso apreciarmos tanto ideais de beleza que são mais comuns em outros países?

Temos que começar a considerar que nossos gostos podem ter sim um viés gordemisico, racista, entre outros preconceitos. Pois se tiramos a improbabilidade e a inconsistência de declarar que um grupo todo não te atrai, o que resta de justificativa?

Como falei, ninguém pode te obrigar a ficar com alguém, assim como ninguém pode comandar sua atração. Só peço que faça o exercício de repensar até que ponto você não teve influência de ideias externas que excluem determinados corpos, dizendo que não são merecedores de relações e afetos.

1 de mai. de 2019

Categorias de atrações

As orientações ou identidades de atração podem ter características ou especificidades que as colocam em posições diferentes entre si, seja por questões que entram no eixo privilégio-opressão (mono x multi) ou questões de vivências e demandas em comum (pessoas a-espectrais).

Podemos separar todas as identidades dentro de cinco categorias:

Mono: atrações por um gênero, de modo que a atração é estrita ou tem raríssimas exceções. Exemplos clássicos são gay, lésbica e hétero. Mas há outras identidades mono que são exclusivas de pessoas não-binárias, como vir e femina, ou que envolvem um espectro/grupo de gêneros com atributos em comum (min, neu, etc).

Multi: atrações por mais de um gênero, o que inclui quantidades conhecidas ou desconhecidas e mudanças de alvos. Há uma lista pronta de identidades multi aqui.

(Bandeira multi)

A-espectrais: atrações que envolvem ausência total ou parcial e/ou condições específicas para despertar atração. Há uma lista pronta de identidades a-espectrais aqui.

(Bandeira a-espectral)

Fluidas: atrações com alvos, condições e intensidades que mudam com certa frequência ou numa constância.

Podem parecer atrações multi, mas pessoas fluidas podem, na vida prática, alternar entre ter atrações por gêneros únicos e por gêneros múltiplos.

(Bandeira abro, um exemplo de atração fluida)

Indefinidas: atrações que são difíceis de especificar, complexas de serem entendidas, ou mesmo indescritíveis. Aqui cabe também pessoas que não desejam por algum motivo definir sua atração.

A primeira identidade de atração indefinida que se tem conhecimento e talvez a mais famosa é a pomo, que existe desde 1997 e serve para toda pessoa não-hétero.

(Bandeira pomo)


Ainda que muitas das identidades se encaixem perfeitamente em uma categoria, existem algumas que podem pertencer a mais de uma dependendo da pessoa. Alguns exemplos são: a identidade paro (que está na lista de atrações multi), se a pessoa em questão tem atração frequente por um gênero e atração condicional por outro; e a identidade com, que, mesmo sendo indefinida, pode denotar atrações mono, multi ou fluidas.

Pessoas a-espectrais podem também ter na vida prática atrações mono, multi ou fluidas (exs: demigay, acefluxo). E pessoas podem ser variorientadas e terem atrações de tipos diferentes dentro de categorias diferentes (ex: lésbica panromântica).

As categorias de fluidas e indefinidas são praticamente desconhecidas ainda no Brasil. É importante falar sobre elas, pois muita gente pode encontrar nelas validação e pertencimento. Atrações em mudanças constantes ou "complicadas" de explicar podem parecer bobagem, indecisão ou até "transtornos". Mas existem e devem ser respeitadas como são.