25 de mar. de 2018

Aquelas microagressões do cotidiano

Uma microagressão é entendida como frases, comportamentos e atitudes que demonstram um pensamento preconceituoso ou normativo numa escala considerada menor, quase sempre cometida sem a real intenção de discriminar.

Mas toda microagressão ainda é uma manifestação dos sistemas opressivos, e por isso precisam ser combatidas. Logo abaixo colocarei as mais comuns cometidas contra a comunidade LGBTQIAP+ (por pessoas de dentro e de fora dela).

- Presumir qualquer característica positiva de pessoas da comunidade.
Que gays são inteligentes, que pessoas bi têm "muitas opções" de parceires, que assexuais e arromântiques não sofrem por relacionamentos ou por amor, enfim, só parem. Enquanto algumas ideias são equivocadas e ofuscam opressões, há outras que mostram cobranças sociais para "compensar" o fato da pessoa estar fora dos padrões.

- Questionar por que a pessoa tem certo gosto ou faz tal coisa só por ela ser [insira o grupo].
Pessoas são pessoas, tá? Orientações, gêneros e sexos biológicos não vêm com um pacotinho de preferências, tendências, aptidões, etc. Isso é só reforçar estereótipos.

- Duvidar da orientação e/ou do gênero da pessoa por qualquer motivo.
Se a pessoa está afirmando que é de tal grupo ou identidade, só podemos dar um voto de confiança e acreditar. Não temos como saber orientação e gênero das pessoas, não temos como entrar na cabeça delas pra "confirmar". E garanto que pessoas não saem por aí afirmando serem de uma classe oprimida sem motivo.

- Falar que algo da comunidade virou "modinha".
Sim, é muita modinha pertencer a uma comunidade discriminada, ter sua existência apagada, sofrer agressão física, ser privade de direitos básicos, etc.

- Não aceitar determinada identidade por ser "desconhecida" ou "confusa" e exigir que a pessoa se identifique com algo mais comum.
As pessoas precisam urgentemente entender que identidades são criadas para descrever experiências. E que nem todes têm experiências que se encaixam em identidades "mais populares". Exigir que aceitem identidades já prontas é apagar a diversidade e um desrespeito imenso com a pessoa.

- Conversar com um homem ou uma mulher já pressupondo que são héteros ("tem namorada?" / "gosta que tipo de homem?").
Muito heteronormativo. Não existe só hétero no mundo. Supere. E não, não venha com as desculpas "a maioria ainda é hétero", "é mais provável que seja hétero", "a pessoa não vai se ofender por ser confundida com hétero", entre outras.

- Negar uma discriminação relatada por alguém ou achar que seu sofrimento é "exagerado" porque conhece uma pessoa que não passou por isso/não é atingida pelo preconceito.
Bom, vou começar admitindo uma coisa: não, nem toda pessoa LGBTQIAP+ do planeta Terra é discriminada todo santo dia e de uma forma violenta. Agora, vamos aos fatos: a) essas pessoas são uma minoria; b) cada pessoa lida com preconceito de formas diferentes e isso deve ser respeitado; c) pessoas discriminadas costumam omitir seu sofrimento ou parecer que nada as ofende para lidarem melhor com a opressão. E essa cartada de "amigue que não sofre preconceito" é uma das várias formas de invalidar opressões existentes. Pare, só pare.

- Perguntar para gays e lésbicas se já se relacionaram com, respectivamente, mulheres e homens para "ter certeza do que são".
Resquício daquela ideia bizarra de que a heterossexualidade é a sexualidade padrão e que o resto só se desvia dela. Por que não fazem a mesma pergunta para héteros?

- Achar que todo homem afeminado é gay e que toda mulher bofinho é lésbica.
Expressão de gênero não tem a ver com orientação sexual. E é muito normativo julgar as pessoas pela expressão delas.

- Afirmar que todo homem acompanhado de um homem gay ou toda mulher acompanhada de uma mulher lésbica são sues parceires/ficantes/namorades.
Sabiam que gays e lésbicas também fazem amizade com pessoas do mesmo gênero?

- Ficar perguntando para as pessoas, principalmente gays, como elas transam.
A vida íntima alheia não é pública!

- Separar gays (cis) em ativos ou passivos, e ainda de acordo com a expressão (masculino, ativo; feminino, passivo).
É tão normativo que nem sei por onde começar, e infelizmente é algo cometido entre gays com frequência. Além de nem considerar versatilidade e gouinage, esse pré-julgamento tem uma base heteronormativa, associando "homem" com "dominância" e "mulher" com "submissão". E esse mesmo princípio faz com que pessoas hétero-cis perguntem para casais de homens e de mulheres "quem é o homem e quem é a mulher da relação".

- Brincar com gays e lésbicas como se elus tivessem repulsa de, respectivamente, vagina/mulheres e pênis/homens.
Orientação sexual não implica em ter repulsa a um gênero e/ou uma corporalidade. E os "nojos" de certas genitálias vindo de gays e lésbicas cis revelam cisnormatividade e diadismo de suas partes.

- Presumir a orientação sexual das pessoas e só pensar nas opções: hétero ou homo.
Existem pessoas que sentem atração por mais de um gênero, tá?

- Perguntar para pessoas bi se elas são "mais homo" ou "mais hétero".
Elas são bi apenas. Parem de usar atração hétero ou homo pra medir bissexualidade!

- Duvidar da existência das atrações fluídas, principalmente a sexual.
Outra forma de contribuir com o monossexismo, como se não fosse possível existir atração por mais de um gênero, mesmo que essa atração seja temporária.

- Dizer que orientações multi são "basicamente bi" ou que "só existe hétero, homo e bi".
A maior opressão aqui é o exorsexismo, pois coloca pessoas não-binárias como homens e mulheres, e que, portanto, só existe atração por dois gêneros (e isso também porque ainda consideram bi como atração apenas por bináries). E apaga uma diversidade de experiências que saem do padrão binário.

- Ficar perguntando para mulheres e homens trans se elus já fizeram cirurgias genitais.
As virilhas alheias não são públicas!

- Dizer para mulheres e homens trans que "nem parecem trans".
Não é elogio. É agressivo, inclusive. É escroto. Coloca ser trans como um tipo de falsificação e que "parecer cis" é o objetivo das pessoas trans.

- Resumir pessoas com pênis a homens e pessoas com vagina a mulheres.
Isso é cisnormativo com homens e mulheres trans que não têm disforia com as genitálias, diadista com pessoas intersexo com genitálias diferentes de pênis e vagina, e exorsexista com todas as pessoas não-binárias.

- Perguntar sobre a genitália de pessoas intersexo.
Novamente, as virilhas alheias não são públicas. Além disso, nem toda intersexualidade tem variações na genitália.

- Perguntar para assexuais se já transaram ou tiveram interesse em sexo.
Isso é claramente a vida privada das pessoas. E mesmo que algumas possam responder tranquilamente, existem assexuais que não gostam nem de falar de sexo. Respeitem!

- Presumir que toda pessoa é alo.
Olha a pessoa e já imagina que ela deve ser alguém sexualmente ativa e/ou procurando o amor da vida dela. Não, nem toda pessoa é assim. Supere.

- Afirmar que "é bom" ser do espectro A porque a pessoa "não sofre por sexo, relacionamentos ou amor".
Pode não aparecer, mas é um pensamento normativo, pois presume que: assexuais não podem transar, arromântiques não se relacionam, e pessoas do espectro não amam por não sentirem atrações sexual e/ou romântica. Amor é um sentimento amplo e não acompanha necessariamente sexualidade e romanticidade. Pessoas A ainda têm sentimentos!

- Achar que viver sem sexo e/ou sem namoro é uma vida infeliz ou incompleta.
A vida é muito mais do que sexo e namoro. Pessoas A podem ser felizes e completas sem nada disso, sem nem ao menos experienciar essas coisas. Pergunte a elas ao invés de usar sua realidade como parâmetro para todes.

- Dizer que não-bináries são "basicamente homens/mulheres" por causa de suas corporalidades e/ou apresentações.
Genitálias e roupas não definem o gênero da pessoa! Não-bináries são basicamente não-bináries. Sempre. A todo momento. Com qualquer corpo e apresentação.

- Duvidar que é possível sentir atração por não-bináries sem encaixar essas pessoas em homem ou mulher.
É um pensamento extremamente exorsexista, pois continua apagando as identidades n-b e reafirma que as pessoas só conseguem enxergar dois gêneros.

- Ditar como pessoas não-binárias devem parecer.
Não, elas não são obrigadas a ter aparência andrógina. Elas não têm que parecer fora da norma, é a norma que tem que deixar de existir.

- Impor que não-bináries usem somente as linguagens o/ele/o ou a/ela/a.
A língua portuguesa foi moldada de uma forma exorsexista, feita apenas para homens e mulheres. E os dois conjuntos foram feitos para esses dois gêneros. Aceitar essa norma é contribuir com a cisnormatividade. Assim como muites transgridem as normas vestindo o que querem e mostrando afeto em público, questionar e desafiar a língua também é válido.

- Falar "todas e todos" como se incluísse todes.
De novo, nem todas as pessoas usam as duas linguagens normalizadas. E a questão não é resolvida dizendo "todas, todos e todes", pois a neolinguagem propõe justamente neutralidade e inclusão totais. Ou você usa só neolinguagem ou usa a língua normativa mesmo.

- Perguntar sobre o sexo biológico de pessoas trans binárias ou não-binárias para "entender" o que elas são.
É muito comum perguntarem isso para assim encaixarem a pessoa como "macho" ou "fêmea" ou confirmar se o corpo é "masculino" ou "feminino". Esse pensamento é cisnormativo e diadista também. E exorsexista, por ainda querer jogar a pessoa em um dos gêneros binários.

- Dizer para pessoas trans binárias ou não-binárias que elas estavam "melhor" sendo do gênero designado.
Elas estão melhor sendo quem são e não estão nesse mundo pra te agradar.



Bora parar de fazer essas coisas? ^-^