27 de dez. de 2017

Discriminações não são fobias

Este é um daqueles tópicos que muita gente vai protestar ou tentar se justificar. Mas isso precisa ser dito.

Popularizou-se pelo mundo palavras de sufixo -fobia que definissem discriminações contra segmentos específicos da comunidade LGBTQIAP+ e outros grupos minoritários.

Todas elas - homofobia, lesbofobia, bifobia, transfobia, intersexofobia, acefobia, arofobia, gordofobia, sorofobia, xenofobia, islamofobia, entre outras - estão sendo usadas de forma errônea. E não, não é pelo significado literal do sufixo, um argumento furado muito usado por gente preconceituosa numa tentativa de desmerecer os crimes de ódio.

A explicação é que palavras de sufixo -fobia caracterizam medos excessivos e irracionais que fazem parte dos transtornos de ansiedade; portanto são distúrbios mentais. Muitas PCDs (pessoas com deficiência) dos ativismos sociais apontam que esses termos acabam reforçando estigmas contra os transtornos mentais e as pessoas que os possuem; ou seja, são capacitistas.

Muita gente pode achar que as discriminações mais violentas podem ser associadas a alguma doença mental, pois quem as pratica costuma mostrar uma instabilidade perigosa. Realmente não é nada normal alguém em plena consciência querer xingar, agredir e até matar pessoas unicamente por suas características. Porém essas atitudes não são frutos de um transtorno mental. E nem de pura e simples ignorância.

A ignorância pode sim gerar preconceitos. Mas mesmo pessoas com acesso à informação podem ainda ter preconceito e discriminarem. Isso denota apenas falta de caráter, uma moral defeituosa.

Essa moral é construída em cima de decisões conscientes: não querer se colocar no lugar das pessoas, não fazer autorreflexão sobre suas ações mesmo que estejam causando sofrimento evidente, se recusar a respeitar e aceitar diferentes características pessoais, mostrar indiferença com a violência contra minorias, etc. Pessoas muito reacionárias chegam até a se orgulhar de discriminar e mostrar um prazer sádico nisso.

Nada disso vem de um contexto traumático ou inexplicável, como as fobias. Essas pessoas sequer se incomodam com seus pensamentos e suas ações. E por isso também que discriminações devem ser criminalizadas, afinal são atitudes conscientes.

Termos alternativos são mais indicados e estão sendo adotados gradualmente em outros países, principalmente aqueles que falam inglês. Pode-se usar “preconceito/discriminação contra [insira o grupo]”, “anti-[insira o grupo]” ou o nome do sistema opressivo (ex: heteronormatividade).

Eu mesmo estive evitando os termos e preferindo usar os nomes dos sistemas. Na minha opinião são uma ótima alternativa porque: são palavras únicas, mais abrangentes e definem toda forma de discriminação. A heteronormatividade, por exemplo, caracteriza qualquer tipo e nível de discriminação contra toda orientação que não seja hétero.

Sei que é difícil admitir um erro dessa proporção e ainda alterar um vocabulário acostumado. Mas devemos sempre buscar combater todo tipo de opressão, isso inclui o capacitismo. Não coloquem ódio, desvio de caráter e falta de empatia no mesmo patamar que distúrbios mentais que causam sofrimento e são clinicamente tratáveis. 

A mudança será bem lenta aqui no Brasil. Entendo a dificuldade de trocar uma terminologia que se espalhou tanto e usada até mesmo em espaços formais como o legislativo. Por isso todxs nós devemos cooperar. De modo algum essa mudança vai interferir nas causas. Era só isso.